"Dr. Caoa": como um médico virou fabricante de carros

O legado de Carlos Alberto de Oliveira Andrade, falecido neste sábado, que criou uma das maiores empresas do setor no Brasil por acaso

LF

Por Leonardo Felix

14.08.2021 às 14:13

Faleceu na manhã deste sábado (14) Carlos Alberto de Oliveira Andrade, fundador do grupo Caoa (cujo nome representa um acróstico de seu nome). A informação foi confirmada pela assessoria de imprensa da empresa por meio de nota oficial.

O empresário tinha 77 anos e o motivo da morte ainda não foi informado. No comunicado, a Caoa informou, por enquanto, que “Dr. Carlos estava com a saúde debilitada por conta de um tratamento de saúde e faleceu durante o sono ao lado de sua esposa e filhos”.

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Ainda segundo a nota, “A empresa, de acordo com o plano de sucessão e governança, continua a ser gerida por seus atuais executivos, que lamentam o falecimento de seu fundador e se solidarizam com a família neste momento”.

“O velório será hoje no cemitério do Morumbi a partir das 14:30, seguido do sepultamento às 17:30", completa o texto (que pode ser conferido na íntegra ao fim desta reportagem).

De médico a vendedor e montador de carros

Carlos Alberto de Oliveira Andrade nasceu em 25 de novembro de 1943 na cidade de João Pessoa, capital da Paraíba. Vindo de uma família com 18 filhos, formou-se em medicina pela Universidade Federal de Pernambuco, mas sempre foi conhecido por ser um excelente negociador.

Sua relação com o setor automobilístico começou no final dos anos 70, quando adquiriu um Ford Landau na única concessionária da marca instalada em Campina Grande, no interior paraibano, onde o médico então vivia.

A revenda quebrou pouco tempo depois e, para não ficar nem deixar outros moradores da cidade sem assistência da Ford, “dr. Caoa”, como ficou posteriormente conhecido, resolveu comprar a loja por um preço camarada e assumir a operação.

Profundo conhecedor do modus vivendi do brasileiro interiorano, Oliveira Andrade fez o negócio prosperar aceitando como pagamento por seus veículos itens como carros usados, cabeças de gado e materiais de construção.

Deu tão certo que sua concessionária começou a chamar a atenção de clientes das principais capitais do Nordeste, como Recife (PE) e Natal (RN). Seu método heterodoxo de negócio chamou a atenção da Ford, que ofereceu a ele tomar conta de sua principal revenda no Recife.

Em seis anos, Carlos Alberto de Oliveira Andrade já era o principal revendedor da Ford no Brasil, tendo assumido também o controle de concessionárias em São Paulo (SP) e outras grandes metrópoles do país.

Com a abertura do mercado nacional para veículos importados, no começo dos anos 90, a Caoa expandiria o ramo de atuação para outras marcas. Primeiro, tornou-se importador oficial da Renault, ajudando a popularizar a marca até o ingresso de uma operação oficial da marca francesa no país, no fim dos anos 90.

Então, o empresário se voltou à Hyundai. Para evitar o erro cometido com a Renault (de fazer o trabalho duro para depois ver a própria fabricante assumir as operações integralmente quando a marca já estivesse estabelecida no mercado), Caoa estabeleceu com os sul-coreanos um relacionamento mais estreito e bem amarrado contratualmente.

Assim, em meados dos anos 2000, no esteio do sucesso do SUV médio Tucson, o médico construiu uma fábrica em Anápolis (GO) para montar via CKD veículos da Hyundai, como o próprio Tucson e os caminhões HR e HD78.

Nos últimos anos, a Caoa vem tocando outro projeto visionário: a empresa estabeleceu uma joint venture com a chinesa Chery para gerir as operações da marca no país, em uma sociedade que fez os carros da marca se tornarem Caoa Chery em nosso mercado.

Com a mesma estratégia agressiva de publicidade adotada antes com Renault e Hyundai, a Caoa levou a Chery a sair de números quase sempre inexpressivos de venda para alcançar mais de 20 mil unidades emplacadas em 2020 e mais de 15 mil apenas no primeiro semestre deste ano.

E com uma diferença: se antes a fabricante da China focava em produtos do segmento de entrada, com baixíssimo custo, agora aposta em SUVs de valor agregado muito maior, como o compacto Tiggo 5X e o médio Tiggo 8, todos vendidos entre R$ 100.000 e R$ 200.000.

Polêmicas, investigações e últimas vitórias

Nem tudo, porém, foram flores durante a vida de Carlos Alberto de Oliveira Andrade. Durante mais de quatro anos, o médico, vendedor e montador de carros foi investigado pela chamada Operação Zelotes, que o denunciava por pagar propina em troca de medidas provisórias de governos federal e estaduais favoráveis à sua empresa.

Ao mesmo tempo, Oliveira Andrade vinha travando desde 2018 uma batalha judicial com a Hyundai para evitar o rompimento de um contrato de representação comercial entre as partes que se estenderia originalmente até 2028, mas que a companhia sul-coreana vinha tentando romper utilizando como brecha algumas metas de venda não cumpridas.

Em março deste ano, a Caoa foi inocentada pelo STJD (Superior Tribunal de Justiça) das acusações impetradas pela Operação Zelotes, confirmando sentença anteriormente proferida pelo TRF1, tribunal de segunda instância. Em ambos os casos, os juízes alegaram não haver provas suficientes para condenço.

Esta e a vitória sobre a Hyundai em uma corte arbitral de Frankfurt (Alemanha), no fim de julho, mantendo à Caoa o direito de ser responsável pela importação de veículos Hyundai ao Brasil, foram as duas últimas conquistas do empresário em vida.

Confira na íntegra o comunicado do grupo Caoa sobre o falecimento de Carlos Alberto de Oliveira Andrade:

"É com profundo pesar que informamos o falecimento do nosso fundador e Presidente do Conselho, Dr. Carlos Alberto de Oliveira Andrade, na manhã de hoje.

Dr. Carlos estava com a saúde debilitada por conta de um tratamento de saúde e faleceu durante o sono ao lado de sua esposa e filhos.

A empresa, de acordo com o plano de sucessão e governança, continua a ser gerida por seus atuais executivos, que lamentam o falecimento de seu fundador e se solidarizam com a família neste momento.

Dr. Carlos foi médico e um empreendedor magistral, tendo atraído importantes marcas para o portfólio da CAOA, como a Ford, a Hyundai, a CAOA CHERY e a Subaru, tendo se tornado um ícone para a indústria automobilística brasileira.

O velório será hoje no cemitério do Morumbi a partir das 14:30, seguido do sepultamento às 17:30."