Chevrolet Blazer: por que o lendário SUV da GM fez tanto sucesso?

Prestes a regressar ao país elétrico e mais urbano, modelo antes derivado da S10 já foi um SUV com receita raiz e motor V6
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23.06.2022 às 11:43
Prestes a regressar ao país elétrico e mais urbano, modelo antes derivado da S10 já foi um SUV com receita raiz e  motor V6

Por Antonio Frauches

Carro de família, de polícia, de frota, de funerária... São só algumas das funções que o Chevrolet Blazer cumpriu ao longo de sua vida. O SUV, vendido entre 1995 e 2011, vai ser relançado nos próximos meses como um SUV ainda grandalhão, porém elétrico e mais urbano.

Em seu primeiro ciclo de vida por aqui, foi um SUV mais "raiz", derivado da primeira geração da picape S10. Muito bem tropicalizado pela General Motors, encaixou-se perfeitamente em um mercado em metamorfose. Se você não estava lá, eu te conto como foi...

A economia estava em aquecimento. A hiperinflação dos anos 1980 havia sido controlada e o Plano Real era ainda um bebê. R$ 1,00 tinha um valor absurdo se comparado aos dias de hoje. Equivalia a US$ 1,00. Para ter uma ideia, o salário mínimo era R$ 100 e o litro da gasolina custava menos que R$ 0,60... 

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Com nossa moeda valorizada e o governo facilitando (ou dificultando menos) as importações, o mercado foi inundado por importados. Em pouco tempo, fomos de um país com a frota quase 100% dominada pelo chamado “quarteto-de-ferro” (Chevrolet, Fiat, Ford e VW) para um lugar onde se via Citroën Xantia, Alfa Romeo 145 e Honda Civic nas ruas.

Nesse contexto, várias marcas tentaram, e fracassaram, se firmar no Brasil. Outras já estabelecidas tentaram trazer modelos modernos, mas igualmente deram com os burros n’água. Exemplos? Fiat Tempra e Ford Explorer. 

“Ah Antonio, mas o mercado não estava preparado para carros modernos assim”. Então me explica: como o Blazer foi um sucesso por 16 anos? O nível de modernidade de um 4.3 V6 1995 é bem próximo ao de um Explorer 4.0 V6 1995. O Explorer ainda tem algumas qualidades que o Blazer não. Qual o diferencial? A maneira como foram introduzidos no mercado.

Em 1995, primeiro ano das vendas, ainda não era comum ver um Blazer ou uma S10 nas ruas. Mas, em 1996, eles chegaram de vez. Com poucas mudanças, provavelmente no intuito de baratear a montagem nacional, como a mudança dos cubos de roda, que passaram de seis para cinco furos, e talvez o principal fator de sucesso: introdução de novos motores.

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Blazer 1996, o modelo que dominou o segmento

Em 1996, o Chevrolet Blazer passou a ter três opções de motorização: Vortec V6 4.3 de 180 cv e 34,7 kgfm; Família 2 2.2 de 106 cv e 19,2 kgfm; Maxion Diesel de 95 cv e 22,4 kgfm. Também oferecia três versões de acabamento: STD, DLX e Executive. 

Com isso, a Chevrolet preencheu uma enorme gama de mercado, que ia desde o frotista que não precisava carregar ou rebocar grandes cargas (STD 2.2) ao produtor rural (Maxion 2.5 4x4), passando por aqueles que queriam algo confortável para viagens em família (DLX ou Executive com o Vortec 4.3 V6, e transmissão manual ou automática).

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Mesmo na versão intermediária DLX o interior simples era demais para um mercado acostumado com pouco

Isso fez com que o SUV inundasse as ruas. Passou a ser usado por locadoras, forças policiais e taxistas. E em um grande golpe do destino, na mesma época o GNV (gás natural veicular) chegou ao Brasil, e teve início a febre de conversão de carros a gasolina e a etanol. 

O motor Chevrolet Família 2 aceitava muito bem essa conversão, por ser robusto e de projeto relativamente antigo, características semelhantes às do VW AP. Isso ajudou ainda mais o Blazer a ganhar sua legião de fãs, dando ao SUV fama de manutenção barata, que acabou se estendendo até ao Vortec 4.3 V6, que de barato não tinha muita coisa...

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A versão STD 2.2, paixão dos frotistas

Estabelecidos os fatos, vamos ao carro. Nem todo esforço e sorte do mundo trariam sucesso ao Blazer se o modelo não fosse bom. E ele é ótimo. Lógico, todo carro tem pontos fortes e fracos. O Blazer sofreu algumas atualizações nos seus 16 anos de mercado, nem todas para melhor. 

Esteticamente, temos como exemplo o polêmico facelift de 2001, quando ele ganhou carroceria com vincos mais fortes, novo conjunto óptico e o apelido “pitbull”. Nos motores, saíram o Família 2 2.2 e o Maxion Diesel 2.5, entraram o Família 2 2.4, de 128 cv e 21,9 kgfm, e o excelente MWM 2.8, de 132 cv e 34 kgfm. 

Já em 2004 ela perdeu o motor que lhe trouxe a fama de potente: foi o último ano de fabricação do Vortec 4.3 V6. Mais tarde, em 2008, o Família 2 2.4 recebeu cabeçote roletado e virou flex, ganhando fôlego e indo a 147 cv no etanol, com o torque permanecendo o mesmo.

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A polêmica frente "pitbull"

O Blazer é extremamente gostoso de dirigir. O banco tem bom apoio e tecido muito agradável nas versões intermediárias e couro nas de topo. O espaço na fileira da frente é muito bom e o acabamento agrada. 

No banco de trás, crianças vão bem, mas adultos com mais de 1,70 m sofrem. O assento é baixo demais, o que faz com que as pernas fiquem muito flexionadas. Há espaço lateral para três adultos, mas falta conforto. 

O porta-malas é enorme, e existe a possibilidade de rebater os bancos traseiros. Eu já carreguei uma cama box de solteiro montada no porta-malas do meu Blazer, com essa configuração e a tampa da mala fechada.

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Uma cama de solteiro montada, dentro de uma Blazer

Problemas? Existem, lógico! O Blazer é um SUV por definição: montagem chassis-carroceria, centro de gravidade alto e ruim de curva. A suspensão traseira por eixo rígido com feixe de molas e a suspensão dianteira macia dão ao carro o comportamento dinâmico de um palhaço andando de um pé só, por sobre um colchão d’água. 

Acha que estou exagerando? Passe com um sobre uma depressão em uma rodovia a mais de 110 km/h para ver… Além da oscilação normal, para cima e para baixo, a frente aponta levemente para a esquerda e para a direita, dando ao motorista mais atento a sensação de que o carro “dança” sobre a suspensão. Não traz risco, é apenas como o conjunto se comporta. 

O problema aqui é que o Blazer mais novo do Brasil tem 11 anos... A suspensão dianteira é do tipo dupla balança, duplo-A ou double wishbone, como queiram chamar, e permite a regulagem de cáster e câmber. 

Se o conjunto não estiver íntegro, essa regulagem se perde, piorando muito o comportamento dinâmico. Mesmo que o carro não puxe para algum lado andando reto e no plano, vai puxar muito quando a suspensão trabalhar. Isso, sim, traz riscos.

O Blazer possui dois braços de direção, um para cada lado, e bieletas na suspensão que comumente apresentam folgas. A princípio, não é algo preocupante nem acarreta falha a curto prazo, mas gera ruídos e aquela sensação de folga no volante. 

Na suspensão traseira, o que pode incomodar é o barulho, aquele rangido característico de feixe de molas, além da reação mais firme em quebra-molas e depressões.

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Braços de direção (esquerda) e bieletas (direita) exigem cuidados

Naturalmente, as versões à diesel possuem manutenção mais delicada, característica de motores desse ciclo. Os Maxion 2.5 apresentam problemas no arrefecimento, mas não chega a ser crítico. Meu palpite é que é mais um problema de dono do que de carro. 

Os MWM 2.8 são muito robustos, mas, assim como qualquer turbodiesel, estão sujeitos a falhas em turbinas, bicos injetores, bombas de combustível, bombas de vácuo... No mais, o acionamento do sistema 4x4 pede atenção, e quando quebra é caro.

As V6 à gasolina possuem peças mais caras, principalmente os componentes eletrônicos. Mas, em geral, não são motores frágeis. O problema é que são carros com 18 a 27 anos de idade. Mesmo que você ache um pouco rodado, os sensores, módulos etc vão, invariavelmente, pedir atenção. E então chegamos às versões de entrada, com motor Família 2.

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Família 2 2.4 de 141/147 cv: o 4 cilindros mais potente da Blazer

Se vocês não conhecem esse motor, acho que, com uma informação, lhes convenço de sua robustez. O Família 2 estreou no Brasil no Monza, como 1.8. Ainda no sedan, cresceu para 2.0, fato que se repetiu no Kadett. Depois, equipou o Omega e o Vectra, 2.0 e 2.2. 

E então chegou a Blazer e S10, primeiro como 2.2 EFI (injeção eletrônica monoponto), depois 2.2 MPFI (multiponto) e, mais tarde, 2.4. Nesse período, ainda equipou Astra e Zafira. Ou seja: um motor muito bem estabelecido por aqui, relativamente potente e com bom torque a baixas rotações, além de barato de manter e beberrão.

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Voltando ao Blazer, as unidades equipadas com motor 2.2 são muito lentas. Já as que contam com o 2.4 de 128 cv são só lentas, enquanto as últimas, com o 2.4 flex de 147 cv no etanol e 141 cv na gasolina, essas sim… São só devagar... 

Piadas à parte, esta última tem desempenho comparável a hatches e sedans médios, ou ainda SUVs pequenos, com motor 1.6, como Ford Focus, Ford EcoSport, Renault Duster... E a manutenção do motor é parecida com a do Astra. O que encarece um pouco é o resto: transmissão, suspensão, direção, pneus..., mas ainda sim é um SUV robusto e simples.

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O painel do meu Blazer 2009

Se você está pensando em um SUV nessa faixa de preço e o Blazer surgiu na sua lista, é fácil decidir! Se você quer um Blazer, escolha um Blazer. Mas se você quer um carro grande, seguro, com estabilidade, e conforto para cinco passageiros, vá em algum outro SUV. 

Qual? De preferência um com construção monobloco, como Hyundai Tucson, Kia Sportage ou Honda CR-V. Estes possuem segurança e dirigibilidade comparáveis a sedans. Com suspensão dianteira McPherson e traseira multlink, você entrará em curvas como se estivesse em um Civic, só que um pouco mais alto. Custam mais caro para manter, mas é o preço da modernidade.

Por que eu comprei um Blazer? Exatamente pelo descrito no parágrafo anterior: eu queria um! Aprendi a dirigir em um 4.3 V6 DLX 1996, e queria um SUV grande, com tração traseira e câmbio manual. Meu Blazer 2009 2.4 Advantage se encaixou perfeitamente na descrição. Já fiz longas viagens, a 120 km/h, pois a relação da transmissão é curta e as altas RPM incomodam. 

Rodo em média 12 km por dia, então o consumo de 6,5 km/l não pesa (tanto)... Já estou com ele há cinco anos e, nesse período, fiquei na rua por causa de um motor de partida. Para mim, é um bom carro, me atende e se encaixa no meu gosto. Mas não se deixe levar pela disputa “raiz vs. Nutella” das redes sociais: escolha com consciência. 

Antonio Frauches é engenheiro mecânico e entusiasta do mundo automotivo.

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Imagens: Divulgação/Chevrolet e Acervo Pessoal

Este texto contém análises e opiniões pessoais do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Mobiauto.

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