Por que a fusão de Fiat, Jeep e Peugeot já domina 1/3 do mercado brasileiro

Enquanto rivais batem cabeça e hesitam em meio a perdas e indecisões das matrizes, Stellantis avança firme rumo a um domínio sem precedentes

LF

Por Leonardo Felix

28.04.2022 às 10:11

A fusão entre os grupos FCA (Fiat Chrysler) e PSA (Peugeot Citroën), formando a poderosa Stellantis, fez muito bem para as duas companhias, em caminhos diametralmente opostos no Brasil e no resto do mundo.

Na gringa, é o braço francês que tem mais força. Por isso, é usado como ponto de partida, graças às plataformas modulares EMP1 e CMP, para a eletrificação de boa parte dos produtos a companhia. Por aqui, ao contrário, Peugeot e Citroën andam perdidas e enfraquecidas há anos, enquanto marcas da antiga FCA – leia-se Fiat e Jeep - velejam de vento em popa.

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Usando uma estratégia agressiva, a Stellantis vem puxando as vendas das duas marcas francesas, que voltaram a ter mais de 1% de participação de mercado no primeiro trimestre de 2022: 2,63% para a Peugeot, 1,47% para a irmã. E olha que nem rolou ainda algum lançamento impactante para elas – o primeiro será o novo Citroën C3, nas próximas semanas.

Ao mesmo tempo, a Fiat chegou a 21,4% de fatia, domínio que não via desde o começo da década passada, enquanto a Jeep abocanhou 7,67%, mesmo tendo apenas três modelos efetivamente em oferta. Até a Ram, uma marca totalmente de nicho, já alcançou seu 0,1%. Parece pouco, mas com produtos na faixa de R$ 500.000, não há do que reclamar.

Como resultado, a Stellantis assegurou para si exatos 33,27% ou praticamente um terço de todo o mercado brasileiro de automóveis e comerciais leves entre janeiro e março deste ano. E a tendência é ampliar ainda mais o domínio, o que seria uma excelente notícia para a empresa, mas não tão alvissareira assim para nossa indústria.

Mercado mais importante e com mais atenção

Enquanto rivais batem cabeça e hesitam em meio a perdas e indecisões das matrizes, Stellantis avança firme rumo a um domínio sem precedentes

O grande trunfo da Stellantis no Brasil está no fato de ser uma filial muito mais relevante globalmente do que qualquer outra montadora aqui instalada, graças ao “lado FCA”. A Fiat, por exemplo, é uma marca expressiva em pouquíssimos países – Itália e Turquia, talvez -, em nenhum deles como no Brasil.

Por isso, a matriz dá aos brasileiros um nível de autonomia que não se vê em nenhuma concorrente. Enquanto executivos locais de gigantes como VW, GM, Renault, Toyota e Honda, têm que suar para convencer os conselheiros globais a aprovarem investimentos, os da Stellantis encontram sendas menos hostis e rostos mais amigos.

Em um cenário de pandemia, isso só se intensificou: a Stellantis usou o prestígio global para manter aqui um volume produtivo e um suprimento de peças mais constante, enquanto suas duas principais rivais, GM e VW, vêm enfrentando paralisações constantes de linhas, visto que a prioridade é abastecer mercados mais abastados.

Tudo isso gera um ciclo (virtuoso para uma, vicioso para as demais): quanto mais volume e relevância, maior a prioridade e celeridade dos projetos. No fim, enquanto as rivais correm com o milho atrás do prejuízo, a Stellantis já foi e voltou com o bolo de fubá pronto para ser servido.

Produtos em todos os segmentos

E a Stellantis vem sabendo aproveitar muito bem essa vantagem, posicionando suas diferentes marcas em segmentos dos mais variados para preencher quase todas as lacunas de mercado. O novo Citroën C3 (SUV de entrada), o Fiat Fastback (um SUV cupê compacto) e a futura picape média da Ram são exemplos disso.

Falta, agora, acelerar o processo de eletrificação, mas o recente anúncio de lançamentos feito pelo presidente da marca na América Latina, Antonio Filossa, mostra que a Stellantis não está parada.

Ótimo para uma, ruim para todos

Os números e cenários são muito positivos para a Stellantis, que faz seu papel como tem que fazer e merece todos os parabéns. Mas não podem nem devem ser comemorados pela indústria brasileira num geral.

A seguirmos nesse compasso, voltaremos a viver num cenário de oligopólio ou, pior, monopólio, o que significará retração de investimentos, fábricas fechadas e muita gente sem emprego.

Basta ver o que fez a Ford há pouco mais de um ano para entender que não há futuro competitivo e com livre concorrência em um mercado estancado e dominado por um ou dois atuantes. A Stellantis tem muito a comemorar, mas a indústria automobilística brasileira tem muito a refletir.