Como planejar bem uma viagem de carro elétrico no Brasil (e você vai precisar)

Para evitar perrengues em viagem de carro elétrico em um Brasil sem infraestrutura, é necessário ter bom planejamento e um bocado de paciência
Camila Torres
Por
11.04.2022 às 10:47
Para evitar perrengues em viagem de carro elétrico em um Brasil sem infraestrutura, é necessário ter bom planejamento e um bocado de paciência

O Brasil ainda não tem a infraestrutura necessária para carros elétricos, o que é, em partes, compreensível, já que é um segmento que ainda está engatinhando por aqui. Em 2021, menos de 3.000 carros 100% elétricos foram vendidos no país. 

Muitas fabricantes têm investido na instalação de pontos de recarga, mas a maioria deles ainda se concentra nos principais centros urbanos. São, portanto, insuficientes para cobrir as rodovias que ligam os principais Estados do Brasil, ou mesmo cidades de porte menor.

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Se os números de vendas sugerem que talvez ainda seja cedo para cobrar uma infraestrutura melhor, investir agora em pontos de recarga será uma das principais formas para incentivar a compra de um veículo eletrificado no futuro. 

Afinal, muitas pessoas não podem nem querem ter um carro elétrico só para rodar na cidade e outro a combustão só para viajar. A boa notícia é que, com o que temos hoje já é possível fazer viagens um pouco mais longas com um carro 100% elétrico, se você souber se planejar. 

A Mobiauto resolveu se aventurar de São Paulo (SP) até Belo Horizonte (MG) com o novo Volvo XC40 Recharge, o primeiro carro 100% elétrico da marca sueca no Brasil. O trajeto tem quase 600 km, ou seja, é impossível completá-lo sem precisar recarregar o SUV, visto que seu alcance no ciclo WLTP é de 418 km. 

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Não conseguimos concluir o trajeto, mas estamos aqui para contar como foi nossa experiência, dividir lições e dar conselhos valiosos de como evitar perrengues em uma viagem no Brasil com um carro 100% elétrico, caso você tenha um e queira se aventurar.


Planeje bem

O planejamento de que estamos falando vai além de conferir a autonomia do veículo e a distância até o destino.

É preciso antecipar o que pode dar errado, mapear os pontos de recarga pelo caminho, descobrir quais desses pontos são de recarga rápida ou não, saber quanto tempo será necessário em cada um deles e, por último, evitar ao máximo ficar com menos de 20% de bateria. E ainda assim as chances de algo sair errado são consideráveis.

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Antes de tudo, há três coisas muito importantes que você precisa saber sobre o carro 100% elétrico:

1) A autonomia varia bem conforme o estilo de condução. Parece óbvio, pois o carro a combustão também é assim: quanto mais pesado o pé do motorista, mais gastão.  O problema é que, no caso do veículo elétrico, a sensibilidade é ainda maior, e uma autonomia como a do XC40 Recharge, de quase 420 km pode cair facilmente para 300 km.

2) Carro elétrico não pode ser guinchado. O motivo é simples e nós explicamos melhor neste outro artigo. De forma objetiva, nos veículos elétricos o ponto neutro (morto) funciona de uma forma diferente.

Enquanto nos veículos a combustão ele permite o desacoplamento da transmissão do motor e, consequentemente, que as rodas girem quando o veículo é rebocado, em um elétrico essa função serve apenas para desconectar os freios para empurrar o veículo por poucos metros até um local seguro. 

Isso porque rebocar um carro elétrico pode danificar os freios regenerativos. Por isso, modelos de algumas marcas têm as rodas travadas quando o veículo fica sem bateria. Assim, a única saída indicada é chamar um guincho de plataforma para levar o automóvel até um ponto de recarga.

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3) Não há pontos de recarga na mesma frequência que postos de combustível. Ao lado da Mobiauto há uma concessionária da Volvo. Quando estamos com modelos da marca, às vezes aproveitamos para carregar o carro lá e tirar algumas dúvidas. Em uma dessas visitas, comentamos os planos de ir de São Paulo a Minas Gerais com o XC40 Recharge.

O gerente nos deu um conselho muito pertinente: jamais deixar para carregar o carro com a carga da bateria muito baixa, pois se esse ponto estiver com algum problema, além de termos que desviar a rota, pode ser que o carro não tenha bateria suficiente para chegar até o próximo ponto. 

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Pensando de uma forma ainda mais prevenida, consideramos que o antepenúltimo posto seria a forma mais segura para não ficar sem bateria na viagem. O problema é que há longos trechos em Minas Gerais entre um carregador e outro, o que torna difícil colocar o conselho em prática. 

Assim, decidimos fazer nossa parada em São Gonçalo do Sapucaí para dormir. A cidade já fica no Estado de MG, porém a cerca de 250 km de São Paulo capital e a menos de 350 km de Belo Horizonte, ou seja: praticamente a metade do caminho.

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A experiência 

Para planejar os pontos de parada, usamos o aplicativo PlugShare, que aponta quase todos os pontos de recarga de carros elétricos espalhados pelo Brasil e ainda indica, teoricamente, se perm

Saímos da região Sul da capital paulista com 74% de bateria. Foi o que conseguimos carregar em seis horas na concessionária. Por precaução, decidimos fazer uma parada no ponto de recarga rápida no Graal em Mairiporã. Percorremos 65 km e gastamos 19% de bateria. 

Apesar de ser um posto de recarga rápida, gastamos mais de uma hora para ir de 55% a 100%. Isso porque, para evitar danos à bateria, uma recarga rápida é sempre limitada até 80% da carga. Os demais 20% transcorrerão em regime lento. Tomamos um café nesse ínterim e, com o “tanque cheio”, seguimos viagem.

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De Mairiporã até São Gonçalo do Sapucaí foram aproximadamente 225 km. A Volvo promete uma autonomia de 420 km, mais que o suficiente. Ainda bem, pois não havia nem um outro ponto de recarga até lá.

O trânsito fluía bem e resolvemos explorar um pouco dos 408 cv de potência e 67,3 kgfm de torque gerados pelos dois motores elétricos do XC40 Recharge P8 (um dianteiro, outro traseiro, ambos síncronos com ímãs permanentes). Com esse conjunto, o SUV vai de 0 a 100 km/h em 4,9 segundos.

Má escolha, pois chegamos ao destino com menos de 25% de bateria. O plano era pernoitar lá e seguir para Belo Horizonte na manhã seguinte. Já havia anoitecido e o PlugShare indicava um ponto de recarga rápida na cidade de Três Corações, em um restaurante chamado Venda do Chico, que ficava a 55 km dali.

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Poderíamos acordar mais cedo no dia seguinte e fazer a recarga, mas decidimos ser prevenidos e fomos à noite mesmo. O estabelecimento já estava fechado e o local, deserto. Parecia que havíamos feito outra má escolha, mas pelo menos o carregador estava lá. Só não era ultrarrápido como o app dizia.

Já era próximo da meia-noite e tínhamos apenas 9% de bateria quando chegamos. O quadro de instrumentos marcava 8 horas de tempo até a carga completa e não daria mais tempo de voltar a São Gonçalo do Sapucaí. A alternativa foi passar a noite no local com o carro carregando.

Às 6h da manhã, tínhamos 83% da carga completa, o que correspondia a 345 km de autonomia, segundo o cluster do veículo. Até Belo Horizonte tínhamos mais 300 km, enquanto o próximo (e único) ponto de recarga até lá ficava em Carmópolis, com 170 km de estrada à frente.

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Foi aí que começou o dilema: parar mais uma vez e perder mais tempo ou arriscar ir direto ao destino final? Como tínhamos hora marcada, seguimos um terceiro caminho: deixamos o carro carregando o dia inteiro na Venda do Chico (os funcionários, gentilmente, permitiram isso) e seguimos viagem em outro carro que nos acompanhava. 

No fim do dia seguinte, voltamos e o carro estava lá, 100% carregado. Seria o suficiente para chegar até Mairiporã ou até mesmo voltar em casa. Como estávamos tranquilos, não poupamos muita energia e isso custou autonomia. 

Chegamos ao Graal com cerca de 30% de bateria, mas aí veio a caixinha de surpresas e a aventura realmente começou: o ponto de recarga não estava mais funcionando. Não sabíamos onde encontraríamos outro ponto de carga rápida, pois o aplicativo não é tão preciso assim. 

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Como já era noite de domingo, resolvemos tentar chegar em São Paulo sem precisar recarregar. A partir daí, a viagem ficou tensa. Foi como estar na reserva em uma região deserta. 

Mas, aí, contamos com dois fatores a nosso favor: de Mairiporã até a capital, a rodovia Fernão Dias possui um bom trecho de serra em descida. Com isso, foi possível aproveitar muito bem as frenagens regenerativas do XC40 Recharge.

Pegamos trânsito e a uma hora e meia seguinte foi longa. A cada 1% de bateria que diminuía, uma gota de suor pingava. Perto de casa, o ponto de recarga mais próximo fica no Pão de Açúcar e é do tipo lento. Na Mobiauto, teríamos a Volvo do lado, que tem carregadores um pouco mais rápidos.

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Decidimos ir para a Mobiauto. Depois de acharmos por muitas vezes que não ia dar, chegamos com 6% de bateria, com muita história para contar e lições importantes.


As lições que aprendemos sobre viajar com carro elétrico

Para evitar perrengues em viagem de carro elétrico em um Brasil sem infraestrutura, é necessário ter bom planejamento e um bocado de paciência

Nossa viagem não foi comprometida só pela falta de infraestrutura de pontos de recarga para carro elétrico, mas por alguns erros que cometemos durante o trajeto.

Erro 1 - Confiar demais em só uma fonte de informação: confiamos só no aplicativo para encontrar pontos de recarga do tipo 2, ultrarrápidos. Deveríamos ter ligado na Venda do Chico e feito o mesmo em BH, onde havíamos planejado deixar o veículo carregando, para confirmar se os pontos lá eram mesmo do tipo rápido e, mais importante, se estavam funcionando.

Como era nossa primeira viagem longa com um carro 100% elétrico, quando vimos centenas de pontos de recarga em MG através do PlugShare, achamos que não teríamos problemas. Só não contávamos que o aplicativo poderia nos dar a informação errada.

Mesmo dentro de São Paulo, passamos por situação semelhante. O Google Maps indicou um ponto de recarga rápida no Morumbi Shopping, mas ele na verdade era lento. O carro teve que dormir no estacionamento e levaria mais de 10 horas para carregar totalmente, pois a bateria estava quase zerada.

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Erro 2 - Não planejar o consumo de energia: por mais que os 408 cv e 67,3 kgfm do XC40 Recharge sejam tentadores, devíamos ter seguido um mesmo ritmo para manter constante o consumo de energia do SUV o tempo todo. 

Quando se dirige de modo a aproveitar as frenagens regenerativas e poupar bateria, a autonomia do modelo é ampla e te abre mais margem de segurança para evitar situações de emergência.


Plano B

Viajar pelo Brasil com um carro elétrico requer muito planejamento para não comprometer a viagem e até mesmo ficar pelo caminho. Em nosso caso, tivemos de apelar a um plano B várias vezes ou teríamos perdido ainda mais tempo. 

O ideal é sempre programar a viagem como se tudo pudesse dar errado, ter um estilo de condução mais econômico, checar previamente se os pontos de recarga planejados para parada estão funcionando e tentar chegar a eles com o máximo de bateria possível. Ah, e tente sempre guardar bateria para chegar a outro ponto próximo aquele esteja com defeito.

Planejamento, plano B e paciência são fundamentais para não tornar a viagem com um carro 100% elétrico aquelas do tipo “com emoção”.


Economia e momentos de prazer

Apesar dos perrengues, nossa viagem com carro elétrico foi uma delícia em vários momentos. O funcionamento silencioso e o ótimo isolamento acústico do XC40 Recharge permitiram curtir muitos momentos do trajeto. 

Por fim, não a melhor sensação de todas é não precisar pagar para abastecer. Em uma viagem como essa, num SUV a combustão. gastaríamos cerca de R$ 600 só com gasolina. Graças aos pontos de recarga públicos, não gastamos nada.


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