Como a falta de planejamento do Brasil nos faz pagar caro pelos combustíveis

Entra governo, sai governo e população sofre com política de preços cheia de soluções paliativas e sem qualquer visão de futuro
BF
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29.03.2022 às 13:23
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Entra governo, sai governo e população sofre com política de preços cheia de soluções paliativas e sem qualquer visão de futuro

Disse o jornalista norte-americano H.L. Menckel (1880-1956) que “para todo problema complexo existe sempre uma solução simples, elegante e completamente errada”. Lembrei-me de Menckel ao acompanhar as soluções propostas pelo Legislativo e Executivo para conter a alta dos preços dos combustíveis. 

A primeira solução “simples” foi na gestão Dilma Rousseff. Ela questionou a paridade dos preços dos combustíveis à cotação internacional do petróleo. Argumentou que o “petróleo é nosso” e cortou a dependência.

Conteúdo em parceria com o Auto Papo

Preços da gasolina e diesel se estabilizaram nos postos, apesar da volatilidade internacional da cotação do petróleo. Só se “esqueceu” das consequências: a medida provocou um rombo de R$ 100 bilhões no caixa da Petrobras, e quase quebrou a empresa. Que não é só estatal, mas pessoas físicas e jurídicas são também acionistas e perderam uma grana graças à D. Dilma.

As soluções “simples” continuam: no governo Bolsonaro, cada vez que sobe o preço do petróleo (desta vez foi pela invasão da Ucrânia pela Russia), diesel e gasolina acompanham a alta. Chiam taxistas, uberistas, caminhoneiros e motoristas. E o presidente repete a presidente: “A paridade não pode continuar”.

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Quem paga a conta?

É fácil interferir nos impostos para baixar o preço do combustível na bomba. Porém, a redução destes tributos significa menor arrecadação aos cofres públicos, que deve ser compensada pelo governo aumentando outros impostos ou tomando emprestado no mercado financeiro, o que provoca inflação que será sentida principalmente no bolso do pobre.

Para reduzir o rombo no caixa do governo, outra ideia é manter o imposto da gasolina, mas aumentar o subsídio do diesel, combustível de caminhões (cargas) e dos ônibus (passageiros), proibido aos automóveis. 

O diesel já paga menos imposto que a gasolina para aliviar o preço do frete e das passagens. Mas acaba beneficiando uma boa parcela dos ricos, pois abastece também dezenas de milhares de luxuosos SUVs.

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Como assim?

Teoricamente, o diesel só poderia abastecer veículos rurais (além de caminhões e ônibus), jipes entre eles, a partir de uma decisão do governo em 1976, em plena crise do petróleo e para reduzir sua importação. Por isso, o diesel foi proibido aos automóveis. 

Mas, no final da década de 90, a Mercedes-Benz conseguiu convencer o governo a homologar seu SUV ML 320 CDI (a diesel) como jipe, apesar de não ter a reduzida, dispositivo mecânico obrigatório para essa classificação.

Nessa controversa homologação, o Contran (Conselho Nacional de Trânsito) avalizou uma ilegalidade que vai rigorosamente de encontro à própria decisão do governo de reservar o diesel aos veículos agrícolas. E abriu porteiras à importação de luxuosos SUVs que aliviam o bolso do rico com o subsídio destinado ao pobre.

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Sem estratégia

Nossos governantes jamais estabeleceram um planejamento para tornar nossa matriz energética minimamente independente do petróleo. Só decisões para apagar incêndios, medidas corretivas e pontuais.

Se reduz o imposto sobre todos os combustíveis, provoca inflação que pesa principalmente no bolso do pobre. Se reduz só o diesel, alivia a conta dos donos de luxuosos SUVs às custas de quem abastece com gasolina sua Brasília amarela.

Nesta semana, um fato inédito: o governo brasileiro finalmente anunciou um planejamento: um plano de incentivo ao gás metano. 

Mas ainda não anunciou um planejamento bem estruturado para produzir outros combustíveis a partir de seus recursos naturais: biocombustíveis que já existem e podem substituir a gasolina (etanol) e o diesel (biodiesel, diesel verde).

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Outra medida “emergencial” desta semana foi a redução do imposto sobre a gasolina, etanol e GLP (gás de cozinha), válida até dezembro deste ano. Ou seja, assim que passarem as eleições…

E outro “quebra-galho” foi dos governos estaduais, que prorrogaram por mais 90 dias o congelamento do ICMS sobre combustíveis, já estacionado desde novembro de 2021.

Por enquanto, como disse Menckel, nossos governantes só adotam soluções simples e burras, incapazes de resolver o complexo problema de combustíveis, pois exigiria deles a inexistente capacidade técnica e de visão do futuro.

Este texto contém análises e opiniões pessoais do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Mobiauto.

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