Frota global de elétricos saltou de 10 milhões para 46 milhões em 3 anos

Hoje, já existem 41 milhões de modelos 100% elétricos em circulação; na Noruega, participação chega a 82%, enquanto, no Brasil, arranha modestíssimos 0,7%
HG
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28.12.2023 às 09:20
Hoje, já existem 41 milhões de modelos 100% elétricos em circulação; na Noruega, participação chega a 82%, enquanto, no Brasil, arranha modestíssimos 0,7%

O leitor que tem viajado ao exterior, principalmente o que foi à Europa, recentemente, já percebeu que o Brasil está totalmente apartado, inteiramente isolado, completamente afastado da virada da eletromobilidade.

Qualquer pessoa que acompanha e conhece o mercado nacional percebe que viramos, nos últimos anos, local de desova para modelos equipados com motores a combustão, zona onde as transnacionais vêm não só largando, mas vendendo por preços infames aquilo que, no além-mar, já é sucata.

“A perspectivas para adoção de veículos com zero emissões são cada vez mais otimistas e a estimativa de participação dos EVs no mercado global, para 2030, cresceu mais de 25 pontos percentuais. Em 2022, projetávamos que os EVs responderiam por 17% das vendas globais, no final desta década, mas com o crescimento vertiginoso registrado neste ano, essa projeção subiu para 36%”, destacou o presidente-executivo (CEO) da BloombergNEF, Jon Moore, no report especial deste mês.

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As montadoras instaladas no Brasil fazem uma enorme pressão nos meios de comunicação, para eles ocultarem e até mesmo renegarem a virada da eletromobilidade, mas a Matemática é uma ciência exata e os números são categóricos, indiscutíveis, inegáveis: no final de 2020, a frota mundial de EVs era de 10 milhões de unidades, número que mais do que quadruplicou, para 41 milhões de unidades, em apenas 36 meses.

“Essa ascensão faz com que as montadoras ocidentais foquem modelos mais acessíveis, capazes de fazer frente à invasão chinesa”, avalia o presidente da startup Brill Power e ex-CEO da Aston Martin, Andy Palmer. A Brill Power desenvolve sistemas de gerenciamento capazes de aumentar o alcance de um EV em até 60%. “Esta é uma urgência de, praticamente, todas a marcas”, acrescentou.

A Renault, por exemplo, acaba de divulgar que planeja reduzir os custos de seus EVs em até 40%, para alcançar a paridade de preços com seus modelos equipados com motores a combustão. A gigante Stellantis está construindo uma fábrica de baterias europeia, em parceria com a CATL, para produção de pacotes (LFP) mais baratos, enquanto Volkswagen e Tesla confirmaram que, num futuro próximo, lançarão novos EVs na faixa de 25 mil euros – hoje, tanto o novo ID.3 quanto o Model 3 são vendidos, na Alemanha, com preços a partir de 40 mil euros.

“Reduzir os custos de produção para ter competitividade frente os modelos chineses é, hoje, a coisa mais importante para qualquer marca ocidental”, assegura Vincent Pluvinage, CEO da OneD Battery Sciences, que adiciona nanofios de silício aos ânodos de grafite, aumentando o alcance e reduzindo o tempo de recarga dos pacotes de baterias.

A OneD é desconhecida, no Brasil, mas nos EUA ela desponta como uma grande promessa, já que desenvolve uma tecnologia que promete reduzir em 20% o peso de uma bateria com capacidade de 100 kWH. Não é à toa que a General Motors é investidora e cliente da empresa californiana.

“Estamos falando de uma economia de 50% para a montadora”, garante Pluvinage, que criou um processo de fabricação usando equipamentos relativamente baratos, usados originalmente pela indústria de painéis solares, que também reduz a complexidade do processo de produção.

Participação de mercado

No Brasil, a participação dos EVs, em 2023, arranha os 0,7%, mas no Primeiro Mundo a realidade é outra: os modelos 100% elétricos – excluindo, portanto, os híbridos puros e plug-in – respondem por 7,5% do mercado norte-americano, 15% do mercado britânico, 18% do mercado alemão, 20% do mercado californiano, 21% do mercado francês, 26% do mercado chinês, 30% do mercado holandês, 40% do mercado sueco e 82% do mercado norueguês.

Como se vê, a ofensiva verde em relação ao setor de transportes tem um foco, que é a mobilidade urbana. E isso tem um fundamento, já que 48% das emissões de poluentes correspondem a automóveis de passeio e comerciais leves.

Os veículos pesados (caminhões e ônibus, principalmente) respondem por 25% das emissões, enquanto a aviação comercial fica com uma fatia de 11% deste bolo; o transporte marítimo, de 10%, e o ferroviário, de 1%.

“Só na Alemanha, que é o principal mercado europeu de automóveis, estima-se que a renovação da frota circulante demandaria 15 milhões de EVs, até 2030, só para cumprimento dos novos limites e das metas climáticas da União Europeia , afirma o diretor do Agora Verkehrswende, instituto alemão que auxilia a redução de gases que provocam o ‘Efeito Estufa’, Christian Hochfeld.

“Em Pequim (China), um de cada dois modelos urbanos é elétrico e isso é fruto de uma política pública, de incentivos fiscais e, também, administrativos – que facilitam e reduzem o tempo de espera para o emplacamento de um modelo 100% elétrico, em relação a outro, equipado com motor de combustão interna”.

Também no que tange às motorizações, a Veekim, com sede em Hodenhagen (Alemanha), desenvolveu uma unidade com ímãs que usam uma forma de ferrite – pó de ferro –, em vez dos caríssimos metais de terras raras. Hoje, alguns fabricantes e seus fornecedores já estão testando esta solução, dentro de suas estratégias para desenvolver EV mais acessíveis.

“As montadoras ocidentais querem reduzir o uso de minerais de terras raras porque a China domina sua mineração e seu beneficiamento”, explica o CEO da Veekin, Peter Siegle. “Os processos de baixo custo, bem como o uso de ferrite e fiação de cobre a partir de impressoras 3D, podem reduzir o preço final de um motor elétrico em até 20%.

E não são apenas as startups que buscam reduzir os custos dos EVs. A fabricante de chips NXP está trabalhando para reduzir a quantidade de módulos de controle eletrônico – hoje, são de 200 a 300 minicomputadores – dos modelos elétricos. A Siemens implementou um simulador de software semelhante ao conceito de metaverso industrial da Renault, que batizou de gêmeos digitais, que reduz pela metade o tempo para desenvolvimento de um EV.

“O problema é que os fabricantes chineses planejam veículos ainda mais acessíveis”, pontua o diretor de eletrificação da NXP, Allan McAuslin. “Hoje, o BYD Dolphin custa 30% menos que o ID.3, da Volkswagen, no mercado alemão”.

Por aqui, o mesmo Dolphin parte de R$ 150 mil, mas a VW brasileira não oferta o ID.3 no mercado nacional, apenas o ID.4 e, mesmo assim, por meio do seu serviço de aluguel Sign&Drive – a partir de R$ 10.000 por mês.

De qualquer forma, enquanto norte-americanos e europeus buscam reduzir os preços dos EVs que vendem, o Brasil segue na contramão, com a volta do imposto de importação, a partir da virada do ano – inicialmente, com a alíquota de 10%, escalonando até 25%, em julho de 2026. Não bastasse o negacionismo de muitos consumidores, ainda temos que enfrentar o protecionismo às transnacionais que está nos levando de volta à “era das carroças”, algo que parecíamos ter superado.

Infelizmente, ostentamos uma vocação para o atraso que não encontra par em nenhum outro país do mundo. E, pior, parecemos nos orgulhar da decadência, do atraso, do retrocesso...

Este texto contém análises e opiniões pessoais do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Mobiauto.

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