Modelos a combustão darão prejuízo, a partir de 2028

Nos últimos oito anos, vendas de automóveis tradicionais caíram 25%, de mais de 80 milhões para casa de 60 milhões de unidades; apontando para o futuro, EVs acumulam alta de 35%, só em 2025
HG
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30.05.2025 às 19:03
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Nos últimos oito anos, vendas de automóveis tradicionais caíram 25%, de mais de 80 milhões para casa de 60 milhões de unidades; apontando para o futuro, EVs acumulam alta de 35%, só em 2025

O mercado automotivo global segue firme no caminho da eletrificação e o leitor não deve se deixar enganar pelo negacionismo. Os números consolidados do primeiro trimestre deste ano revelam que os modelos eletrificados, que correspondem à soma dos híbridos plug-in e dos EVs, já respondem por 21% das vendas mundiais, superando 4,1 milhões de unidades – em outras palavras, um de cada cinco carros de passeio e comerciais leves vendidos em todo planeta, em 2025. Mais impressionante, os modelos verdes (100% elétricos) acumulam alta comercial de 35% neste ano, em relação ao mesmo intervalo de 2024, com uma taxa de crescimento superior à dos híbridos plug-in.

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“É um índice de aumento maior do que o registrado no ano passado e, também, em 2023”, destaca o economista e gerente de dados da Agência Internacional de Energia (IEA), Nick Johnstone. “Estamos falando de um milhão de EVs a mais, só entre janeiro e março. Colocando uma lupa na China, em fevereiro, observamos que os modelos eletrificados já abocanham metade do bolo, respondendo por 50% das comercializações no maior mercado automotivo do mundo – o mercado chinês, com 26 milhões de unidades anuais, é 1,6 vez maior que o dos Estados Unidos. Já no Reino Unido, eles responderam por 30% das vendas no primeiro trimestre”, pontua Johnstone.

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No Brasil, onde os dados do primeiro quadrimestre já foram consolidados, os EVs, com 17.695 emplacamentos, cresceram nada menos que 595%, em relação a 2023. Na prática, isso quer dizer que, em apenas dois anos, as vendas dos modelos verdes foram multiplicadas por seis, enquanto o mercado nacional cresceu menos de 22%, no mesmo período. “Hoje, a tecnologia oferece uma diversidade de opções para o consumidor e as pessoas tomam sua decisão conforme seu estilo de vida”, destaca o presidente da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), Ricardo Bastos. “Mesmo com a nova metodologia adotada pela ABVE, que deixou de contabilizar os micro-híbridos, os eletrificados cresceram 6,6% entre janeiro e abril”, sublinha Bastos.

O que pouca gente se dá conta, é que os números globais dos automóveis equipados com motores a combustão interna vêm caindo faz tempo, desde 2017. Tanto a IEA quanto a Bloomberg New Energy Finance apontam quedas subsequentes há, pelo menos oito anos, de um recorde de mais de 80 milhões de unidades, registrado entre 2016 e 2018, para a casa de 60 milhões de unidades – um encolhimento de 20 milhões de unidades, que representa perda expressiva de 25%.

Perdas e confiabilidade

O declínio dos modelos com motor de combustão interna se intensificou, na Europa, entre janeiro e abril deste ano. Lá, os movidos a gasolina caíram mais de 20%, totalizando 1,04 milhão de unidades, o que fez sua participação de mercado cair de 35% para 28%. Frise-se que todos, dentre os principais mercados da União Europeia (UE), tiveram retrações de dois dígitos, com a França apresentando a queda mais acentuada (-35%), seguida por Alemanha (-26%), Itália (-14%) e Espanha (-12%). Já os movidos a diesel caíram mais ainda, 26%, deixando o segmento com uma fatia reduzida a 9%. Só em abril, os modelos movidos a gasolina encolheram 20%, em relação ao mesmo mês de 2024, enquanto os a diesel viram suas vendas contraírem 24%.

“Nossas mais recentes estatísticas sobre avarias também apontam que os EVs são, ao contrário do que muitas pessoas imaginam, mais confiáveis que os modelos tradicionais, equipados com motores a combustão”, comenta a pesquisadora da Universidade Munique e do Centro de Tecnologia da Allgemeiner Deutscher Automobil-Club (ADAC), Bettina Schröpf.

A ADAC, popularmente conhecido como Automóvel Clube da Alemanha, é uma associação que presta serviços de seguridade e assistência rodoviária, dispondo da maior frota alemã de ambulâncias aéreas e helicópteros de resgate, seguridade e informação. Só em 2024, seus ‘Yellow Angels’ atenderam 3,6 milhões de chamados. “Pela primeira vez, comparamos EVs e modelos a combustão durante seus três primeiros anos de registro”, conta Bettina.

“E a resposta é: veículos elétricos têm menor propensão a defeitos do que automóveis convencionais, quando têm a mesma idade. Nos modelos a combustão registrados em 2020, portanto com quatro anos de uso, o número de problemas foi 1,5 vez maior; nos com três anos de uso, duas vezes maior, e nos com dois anos de uso, mais de três vezes maior”, detalha a pesquisadora.

Na soma, a ADAC identificou que a cada 1.000 carros de passeio e comerciais leves equipados com motores a combustão, com até quatro anos de uso e que circulam pelas rodovias alemãs, 26 apresentam problemas mecânicos e/ou elétricos que demandam serviços assistenciais, número que cai para 14 nos EVs. “A maior confiabilidade dos veículos elétricos, apontada pelos dados de nosso relatório, reduz o preconceito que alguns consumidores ainda têm e, mais importante, ajuda este nicho a seguir crescendo em participação”, avalia o desenvolvedor do Centro de Tecnologia da ADAC e coautor da pesquisa, Jan Schreier.

Virada em 2038

De volta ao declínio dos modelos equipados com motores a combustão interna, projeções do Morgan Stanley, banco de investimentos que é a referência global em serviços financeiros, apostam que os EVs podem ultrapassar os automóveis tradicionais em 2038, superando uma frota mundial de um bilhão de unidades, até 2047. “É possível que, em três ou cinco anos, a lucratividade média dos modelos a combustão, em queda desde o início desta década, eventualmente se transforme de prejuízo, já em 2028”, comenta o editor-chefe da “Visual Capitalist”, Jeff Desjardins.

“Ao mesmo tempo, a transição para veículos elétricos se tornará um negócio lucrativo, antes de 2029 – as margens negativas para EVs atingiram seu pico em 2023”, complementa Desjardins, que acompanha os programas de aceleração para tecnologias emergentes do Fórum Econômico Mundial (WEF).

Até o início deste ano, o mercado de EVs foi impulsionado principalmente pelo interesse dos consumidores e por generosos incentivos governamentais. “O cenário está mudando, especialmente na Europa, onde os governos estão retirando subsídios ao mesmo tempo em que as regulamentações são cada vez mais restritivas, em relação às emissões de carbono. Cada fabricante deverá aumentar seu mix comercial de emissão zero para evitar multas astronômicas, lembrando que, em 2030, haverá um grande arrojo e, em 2035, os modelos a combustão serão proibidos”, lembra o engenheiro e analista do IDTechEx, consultoria especializada em tecnologias emergentes e inteligência de negócios, Shihao Fu. Um ano antes, em 2034, o mercado de EVs movimentará US$ 2,5 trilhões anuais.

De acordo com ele os custos totais de produção, principalmente os dos pacotes de baterias, se estabilizarão e mais de 215 milhões de pontos de carregamento para EVs serão necessários, o que demandará um investimento global em infraestrutura de recarga de quase US$ 105 bilhões (o equivalente a R$ 600 bilhões), só até 2035.

Este texto contém análises e opiniões pessoais do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Mobiauto.

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