Até quando teremos carros tão velhos e perigosos rodando nas ruas sem punição?

Nenhum governo enfrenta os dois principais problemas que o impedem de fazer cumprir a inspeção veicular prevista no CTB há 25 anos
BF
Por
14.09.2023 às 12:34
Nenhum governo enfrenta os dois principais problemas que o impedem de fazer cumprir a inspeção veicular prevista no CTB há 25 anos

Além das Brasilias Muito Velhas (BMV), não faltam escombros sobre rodas que circulam livremente pelo país, ameaçando a integridade física e de saúde do cidadão e a fluidez do trânsito.

Falta uma legislação específica para coibir a circulação de veículos sem condições mínimas de segurança e que superam os limites de emissões de gases poluentes? Não. O artigo 104 do Código Trânsito Brasileiro (CTB) de 1997 é muito claro:

”Os veículos em circulação terão suas condições de segurança, de controle de emissão de gases poluentes e de ruído avaliadas mediante inspeção, que será obrigatória, na forma e periodicidade estabelecidas pelo Contran para os itens de segurança e pelo Conama para emissão de gases poluentes e ruído”.

Você também pode se interessar por:

Prevista pelo CTB há 25 anos, o Contran apenas regulamentou a Inspeção Técnica Veicular (ITV) 20 anos depois, em novembro de 2017. E exigiu que até dezembro de 2019 os governos estaduais a implementassem.

Como seria realizada? Obrigatória em todos os veículos, cada dois anos, como pré-requisito para o licenciamento anual. Carros zero km para até sete passageiros teriam prazo de três anos para a primeira ITV depois do emplacamento.

Mas, alegando dificuldades para cumprir a lei, os Detrans logo solicitaram uma ampliação do prazo, concedida pelo governo federal no ano seguinte, sem estabelecer uma nova data para vigorar. Como – lamentavelmente – se previa, nada de novo aconteceu decorridos 25 anos de vigência da legislação e mais de quatro desde sua regulamentação.

Por que nenhum governo teve coragem de implantar a ITV? Pois sofre duas pressões políticas.

O filé e o osso

O primeiro obstáculo para se implantar a ITV está nas dimensões continentais e variações demográfica e econômica do país. Caberia ao governo estadual viabilizar a operação, fazendo a licitação e certificando empresas a realizar a vistoria. Mas, como distribuir a operação entre os interessados em prestar o serviço? Em grandes metrópoles, nenhuma dificuldade e já foi até realizada a inspeção na capital paulista pela Controlar entre os anos de 2008 e 2014.

Não faltam empresas interessadas em participar da licitação e investir na operação que atende milhares de veículos em grandes cidades. Entretanto, quem estaria interessado em investir numa oficina que prestaria o mesmo serviço numa região de baixa densidade demográfica e que atenderia apenas algumas dezenas de automóveis mensalmente?

Foi então imaginado um esquema de distribuição das competências, atribuindo à uma mesma empresa algumas cidades populosas e outras menos densas. Ou seja, a empresa que pega o “filé” teria que se responsabilizar também pelo “osso”.

Mas não se chegou a nenhum acordo depois de inúmeras tratativas de empresários com os governos federal e estaduais, tamanha a complexidade da operação. E a inspeção não sai do papel.

‘Lata Véia’

Outro problema que dificulta a ITV é o grande volume de carros em frangalhos que rodam por aí. Quem circula nas capitais e grandes cidades só percebe na periferia o estado deplorável de conservação dos veículos. Quanto menos favorecidas economicamente as regiões, maior o número de carros que só andam por milagre.

Queimam óleo pelo escapamento, pneus carecas, carroceria apodrecida, sistema elétrico em frangalhos, parabrisa trincado, sem faróis nem lanternas, freios deficientes, escapamento barulhento.

Qual o resultado de se submeter estas “latas véias” a uma inspeção veicular? Serão obviamente reprovadas e, pior, o custo para que se enquadrem dentro das exigências da lei é superior ao seu valor venal. Na prática, a única solução seria seu sucateamento.

Entretanto, por mais decadentes e perigosas, são a ferramenta de trabalho de milhões de prestadores de serviços mais humildes, pedreiros, bombeiros, pintores e outros que moram pelos rincões e depende do carro em seu dia a dia.

Exigir a ITV destes carros é decretar sua morte, o que torna esta medida extremamente impopulista e por isso dificilmente adotada por qualquer governo.

Solução? Um plano para que cada veiculo sucateado gere um crédito e financiamento com taxas especiais para a compra de um novo ou semi-novo em bom estado.

Comentários