Anos 90: carros que você nunca viu (ou não lembra), mas eu testei
Ingressei na profissão de jornalista automotivo no exato momento em que as importações de carros foram reabertas, no comecinho da década de 90. Até aquele momento, quando um Ford Del Rey virava o ano/modelo e havia uma troca de polaina, isso rendia matéria de capa de revista, visto que, de 1976 a 1990, as novidades brotavam somente de quatro fabricantes. E eles eram beeeeeem preguiçosos para efetuar atualizações nos produtos. Tanto que Opala (preste atenção no que eu disse... O-PA-LA) era sinônimo de carro top de linha no Brasil. Aff...
Na hora em que o governo federal abriu a porteira, porém, houve uma saraivada de novidades. Todo mundo se lembra do primeiro carro importado que desembarcou no Brasil, um BMW Série 5. Todo mundo lembra de Alfa Romeo 164. Dos primeiros Mitsubishi Pajero e Nissan Pathfindfer – os grandes responsáveis, na minha opinião, por brasileiro ter ficado tão fã de suves. Todo mundo lembra de Mercedes 190, Renault 19, Citroën XM e Peugeot 205.
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Carro importado era pauta todos os dias. Nem havia muito como selecionar o que, de fato, teria potencial para ser relevante sob o ponto de vista do mercado. Não é mea culpa, não. É (era) a realidade. Ninguém poderia supor que Kia Besta e Lada Laika fariam o sucesso que fizeram, por exemplo. Ou imaginaria que a Mazda seria um fiasco no Brasil, considerando a linha robusta que emplacou nas ruas brasileiras (Protegé, 626, 929, MPV, MX-3, MX-5 Miata, RX7 etc).
Na prática, testávamos tudo. “Carro novo no mercado? Dá aqui e eu faço matéria”. O tempo decretaria quais deles teriam relevância histórica, como Toyota Hilux, Honda Civic, Mitsubishi L200, Kia Sportage (...), e quais se tornariam inexpressivos – caso de Peugeot 405 Break, Hyundai Galloper, Volvo 460 etc. Nesse segundo grupo, inclusive, é bem provável que alguns deles você nunca nem tenha visto ao vivo. Vou relembrar os que eu testei. Lá nos comentários, eu tenho certeza de que você vai me ajudar a rememorar outros tantos.
E ela pertence à Toyota
Você se lembra da Daihatsu, marca de modelos compactos que faz parte do grupo Toyota? Pois o exemplar aqui em questão é o Charade. Mas poderia ser o subcompacto Cuore, o sedã Applause ou os jipinhos Terios e Feroza, embora esses dois últimos, por se colocarem como alternativas aos modelos 4x4 da Suzuki em meados dos anos 90, tornaram-se mais conhecidos. Quem lembra da Daihatsu??
Divulgação/Daihatsu
O dólar valia menos que o real em meados dos anos 90 e a alíquota de importação bateu em 20%, tornando dezenas e dezenas de modelos extremamente competitivos – é só lembrar que o Fiat Tipo i.e. (importado da Itália) foi o segundo carro mais vendido em 1995 no Brasil, perdendo apenas para o VW Gol.
Mas o sol não brilhava para todos: o Charade teve poucas chances. Com motores 1.3 e 1.5, ele custava mais caro que os carros médios (o próprio Tipo, além de Golf e Astra). E era 6 cm mais curto do que o VW Gol. É daqueles carros que apareceram mais na mídia do que nas ruas.
Eu queria uma Parati assim naquela época
Cordoba Vario. A Volks importou quatro modelos de sua subsidiária espanhola (a Seat) entre 1995 e 2002, em sua maioria fabricados na Argentina: o hatch Ibiza, o sedã Cordoba, a wagon Cordoba Vario e uma “Fiorino”, chamada Inca.
Divulgação/Cordoba
Essa bela peruinha me faz lembrar daquela regrinha básica que todo designer aprende no primeiro dia: “forma ou função?” Forma é quando você quer deixar um carro bonito e releva aspectos de usabilidade. Função é o contrário. Função é a Kombi: aproveita-se o máximo possível de espaço em um carro de carga. A carroceria vira um pão de forma? Azar do design.
A Seat Cordoba Vario é um perfeito exemplo de forma. Se eu compro uma perua, pressupõe-se que eu precise de espaço no porta-malas, não? Pois o dessa camioneta era menor, aliás, bem menor do que o da versão sedã: 390 contra 455 litros. Para que a perua, então, brasil? Só se for para deixá-la bem bonita. Então tá bom.
Outra perua que nunca emplacou
Divulgação/Peugeot
Peugeot 405 SRi Break. Conhece? Acho que não vejo uma nas ruas há mais de 10 anos. Ou 15. Derivada do 405 Sedan, essa simpática camioneta de porte médio povoou ruas brasileiras entre 1993 e 1994. Na versão top trazida ao país, batizada de SRi, tinha motor 2.0 de 121 cv e câmbio manual. Durou poucos anos, pois custava US$ 50 mil – e você se queixa do preço atual dos nossos carros... rs. Uma VW Quantum, de mesmo porte, saía por US$ 35 mil.
O sedã mais sem graça que a Volvo já trouxe
De porte médio, como um Chevrolet Monza, o Volvo 460 não “aconteceu” no Brasil. Destacava-se o motor 1.7 turbo de 122 cv, que o tornava divertido, mas o estilo ainda era daquela escola sueca que enfatizava a segurança e não fazia a menor questão de ser bonito.
Divulgação/Volvo
Motores turbo eram raros na época, com seus torques disponíveis já em baixos regimes de rotação, atrelados aos câmbios manuais. Mas o público não curtiu, preferindo modelos de maior porte da marca. A conta era simples: preço por metro cúbico de carro. E ele parecia “pequeno” para custar as dezenas de milhares de dólares que custava. Além de ser feinho de dar dó.
O 460 fazia parte de uma família que trazia o razoável fastback 440 e o pavoroso hatch 480. Foram substituídos, se não me engano, em 1996 pelos belos S40 e V40, que traziam carrocerias maiores e bem-dotadas no design. Você já viu alguma vez esse Volvo 460 rodando por aí? Se não viu, também, não perdeu nada.
Hyundai o quê??
Divulgação/Excel
O Hyundai Excel (hatch compacto lá do início da década de 90) foi um dos piores carros que testei na vida. Isso leva a outro raciocínio: poucos fabricantes mundiais evoluíram tanto em design, tecnologia e sofisticação nas últimas três décadas como a marca sul-coreana. Pois como uma empresa que produzia carros tão desinteressantes melhorou tanto? Pois o Galloper é outra prova cabal dessa ascensão, considerando que ele foi o “ponto de partida” no segmento de suves.
Vamos localizá-lo no tempo: embora fabricado nos anos 90 é nítido que o design do jipão de 2,5 toneladas remete à década anterior. E não é só impressão. Em 1991, a Hyundai comprou o ferramental da geração anterior da Mitsubishi Pajero, que data da década de 80, e o lançou como “novo” Galloper. Feio e antiquado, ele não tinha atrativos. Com motor V6 de 160 cv e tração 4x4, a coisa dó piorava: ele conseguia a proeza de ser mais caro no nosso mercado que a própria Pajero. E nem dá pra dizer que tenha caído no esquecimento, pois você só esquece de algo que “existiu”. Duvido que alguém se lembre de ter visto algum.
Sedã da Kia? Lembra disso?
Se a parada era dura para sedãs japoneses como Mazda Protegé, Nissan Sentra, Mitsubishi Lancer e Daihatsu Applause, em um mercado que logo elegeu Honda Civic e Toyota Corolla como referências, imagine para uma marca que ficou conhecida no Brasil por uma van de passageiros chamada BESTA e cismou de importar seu primeiro sedã?
O trabalho feito na Kia ao longo das últimas décadas foi exemplar. Eles conseguiram transferir a imagem de “marca de sucesso” de veículos utilitários em favor de modelos de passageiros (como Carnival) e suves (caso de Sportage), mesmo com carros pouco atrativos. Se você lembra da primeira geração do Sportage, aliás, sabe do que estou falando. Êta troço feio e desajeitado. Hoje, contudo, é indiscutível a atratividade desses modelos. Mas lá atrás era bem difícil...
Pois olhe bem o Kia Sephia: provavelmente será um dos únicos (ou o único) que você verá na sua vida...rs. Não vendeu nada lá. E nem tinha dotes pra isso, principalmente porque não trazia preço competitivo, nem pacote técnico ou status para encarar Honda e Toyota. Para ser bem sincero, tive certa dificuldade até para lembrar do nome do carro.
O carro 1.0 de vida mais curta da história
O único carro nacional da lista é um case à parte. Poucos modelos tiveram vendas tão irrisórias, mas, neste caso, devido à vida curtíssima. O Polo “popular” durou 1 ano. Mas nem foi culpa da VW, que, aliás, havia arquitetado uma interessante versão 1.0 de quase 80 cv para seu melhor compacto, em meados de 2002.
Ocorre que, por coincidência, e simultaneamente à apresentação do carro, o governo anunciava a redução de alíquotas de IPI de carros com motores entre 1.0 e 2.0, de 25% para 16%. O motor 1000 pagava 9%. Na prática, a distância que havia antes entre o Polo 1.0 e o 1.6, que justificaria a versão popular, foi diminuída para menos de R$ 800 no preço final quando o imposto mudou. Ou seja: todo mundo pagava a diferença e saía da revenda de 1.6.
E você? Quer acrescentar no comentários os carros mais “esquecíveis” do passado recente do mercado brasileiro??
Este texto contém análises e opiniões pessoais do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Mobiauto.
Por Edu Pincigher