Carros estão mais caros e ainda perderam qualidade

Índide de qualidade sobre o setor automotivo da J. D. Power audita média de 192 defeitos para cada 100 modelos novos vendidos, nos EUA
HG
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04.07.2023 às 11:00 • Atualizado em 12.11.2024
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Índide de qualidade sobre o setor automotivo da J. D. Power audita média de 192 defeitos para cada 100 modelos novos vendidos, nos EUA

Pouca gente sabe, mas existe um relatório anual que mensura os níveis de qualidade das principais marcas globais. Esta análise é produzida pela J. D. Power, consultoria líder no fornecimento de dados avançados que subsidiam o setor automotivo, e suas pesquisas acontecem longe daqui, nos Estados Unidos.

O “Initial Quality Study (IQS)”, como o próprio nome sugere, audita a qualidade inicial dos automóveis vendidos no mercado norte-americano, durante seus primeiros 90 dias de propriedade – ou seja, é um recorte dos três primeiros meses de vida de cada modelo. A pesquisa inclui 223 itens e eventuais problemas apresentados, em nove categorias, que vão do trem de força (motor e transmissão) à climatização interna, passando pelo acabamento e pela eletrônica embarcada, entre outros.

“O resultado parte do número de problemas apresentados por cada 0 km, exibindo em relação a cada cento. Para o relatório de 2023, a média geral foi de 192 problemas para cada 100 veículos (192 PP100), tendo a Dodge como a marca de maior qualidade inicial, com 140 PP100 e a Volvo como a pior, com 257 PP100”, conta o diretor de benchmarketing automotivo da J. D. Power, Frank Hanley.

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O mais curioso do estudo, no entanto, é o fato de, enquanto as campanhas publicitárias alardeiam carros cada vez mais avançados, o número de problemas apresentados aumentou incríveis 30 PP100 só nos últimos dois anos, um recorde nas quase quatro décadas de história do IQS.

“Há uma ampla gama de problemas de qualidade, algo que nunca havíamos visto. A indústria está em uma encruzilhada e o caminho que cada fabricante escolhe é fundamental para o seu futuro. De defeitos persistentes de anos anteriores a novos tipos de problemas, os 0 km de hoje não vêm satisfazendo os clientes na medida em que suas tecnologias decepcionam os consumidores”, avalia Hanley.

O que ele está dizendo, de forma muito polida, é que os automóveis estão cada vez mais caros e, o mais importante, piores. Que por trás daquilo que o design emoldura, há economia em tudo, principalmente naquilo que os olhos não enxergam, além de hardwares e softwares de baixa qualidade, que apresentam falhas ininterruptas de funcionamento – e que nunca serão sanadas, em face da sua precarização.

Mas neste cenário, em que o consumidor é o grande perdedor, há quem tenha – e muito – o que comemorar: nominalmente, o grupo Stellantis, que viu três das suas seis marcas nas três primeiras posições do ranking.

“É muito gratificante ver que nossas novas práticas e nossos novos métodos estão funcionando”, disse à “AutoNews” o gerente norte-americano de qualidade e engenharia da Stellantis, David McDonald, que ingressou na companhia em 1993 e se aposenta na próxima semana, depois de 30 anos de casa, com a tríplice coroa conquistada por Dodge, RAM e Alfa Romeo.

“Implementamos novos controles em nossas fábricas, trouxemos engenheiros para a auditoria interna, criamos um modelo de contenção imediata, padronizamos a produção em todas nossas plantas e nos reconectamos com os concessionários, que nos repassam a experiência dos clientes”, destacou McDonald.

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É verdade que, há exatos dez anos, as mesmas três marcas estavam entre as oitos piores no IQS, mas o executivo omite que, apesar da posição de liderança, em 2023, o número de problemas para cada 100 veículos saltou de 130 PP100 para 140 PP100, no caso da Dodge, e de 132 PP100 para 141 PP100, no caso da RAM.

Ou seja, a queda de qualidade geral da indústria automotiva – e olhe que estamos falando das marcas mais prestigiadas do mundo – foi tão grande que, mesmo com uma piora nos resultados, em relação a dez anos atrás, Dodge e RAM conquistaram as medalhas de ouro e de prata no IQS 2023. Um verdadeiro absurdo!

Problemas dobram nos Porsche

Nesta última década, os preços dos esportivos da Porsche aumentaram 7%, nos Estados Unidos e Europa (no Brasil, a inflação da marca chegou a mais de 100%), ao mesmo tempo em que a qualidade inicial de seus automóveis caiu vertiginosamente. Em 2013, a cada lote de 100 modelos vendidos por seus concessionários norte-americanos, a J. D. Power anotava 80 defeitos.

Agora, são 167 PP100, mais do que o dobro. “Não vejo essa tendência de queda na qualidade sendo revertida tão cedo. Basta ver que os índices só melhoraram para 12 das 33 marcas pesquisadas, revelando grandes problemas e uma perspectiva de que as coisas darão ainda mais errado para a maioria delas”, avalia o diretor de benchmarketing automotivo da J. D. Power, Frank Hanley.

“A liderança obtida pelas marcas da Stellantis também não quer dizer muito, já que seus veículos mudaram muito pouco do ano passado para cá, o que tende a reduzir o número de problemas apresentados nos primeiros três meses. Já a Toyota caiu oito posições na tabela, ficando num desonroso 22º lugar”, acrescentou.

No caso da montadora japonesa, uma das líderes do mercado norte-americano e uma das mais bem-conceituadas, no Brasil, a adoção de um novo sistema de infotainment foi a grande vilã de sua nota preocupante: 194 PP100 ou 194 defeitos para cada 100 veículos comercializados, uma média de quase dois problemas por unidade e, isso, só nos primeiros 90 dias de uso.

Indubitavelmente, a Volvo foi a grande decepção do IQS 2023, ficando em último (atrás mesmo de Chrsyler e Volkswagen) com inaceitável 250 PPM e “coroando” sua falta de qualidade com os incríveis 313 PP100 de sua subsidiária de EVs, a Polestar. Isso quer dizer que um 0 km da marca vai levar o dono ao revendedor ou o próprio automóvel para a oficina, muitas vezes guinchado, por pelo menos três vezes e isso – é fundamental lembrar e relembrar – só nos primeiros três meses de uso.

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Um fato que nos diz respeito é a medalha de ouro obtida pela fábrica mexicana de San Luis Potosí, da General Motors, com 29 PPM. Quem tem mais de 20 anos de “quilometragem”, na cobertura do setor automotivo, sabe que o México se consolidou como uma alternativa industrial ao Brasil há pouco mais de duas décadas e que, num passado não muito distante, os brasileiros caçoavam dos modelos “chicanos” – mas o Brasil andou para trás e eles, para frente. Só outras duas fábricas alcançaram este mesmo índice: a planta holandesa de Born, da BMW, e a coreana de Kwangju, da Kia (grupo Hyundai).

Fidelidade da Toyota também cai

Uma semana depois da divulgação do IQS, da J. D. Power, a S&P Global Mobility divulgou seu ranking de fidelidade, referente ao primeiro quadrimestre deste ano. Ford e Chevrolet lideraram a pesquisa, deixando a ex-líder Toyota – agora, na sétima posição – para trás. “Com um índice de fidelização de 59,5%, a Ford assume a ponta, seguida pela Chevrolet, com 57,1% (alta de 2,6 pontos percentuais). Com mais de 10% de queda, a Toyota perdeu 5,7 pontos percentuais e caiu para 52,3%”, mostrou o analista Tom Libby, durante o webinar da S&P.

“Obviamente, vamos observar os resultados daqui para frente, mas, nesses primeiros quatro meses, a Toyota foi uma grande decepção”, disse Libby. “Pior para os japoneses, a porcentagem de clientes que migraram da sua marca para a Tesla aumentou 2,1 pontos, chegando a 5% no acumulado do último ano”.

Traduzindo, só nos últimos 12 meses, cinco de cada 100 proprietários de veículos Toyota migraram para a Tesla – se existe algo pior, para uma montadora, eu desconheço. “Embora as vendas de EVs permaneçam pequenas, em muitos mercados, não há dúvida de que não só a Toyota, mas a própria Honda e algumas outras marcas asiáticas estão sendo muito impactadas pela Tesla”, pontua o analista.

“A Tesla, por sua vez, segue liderando o ranking de fidelidade entre as marcas de alto luxo, com um índice de 68%, escandalosos 18,8 pontos percentuais acima da BMW, que vem na segunda posição. E aqui há um detalhe importantíssimo: que sem nenhuma outra marca de prestígio com fidelização acima de 50%, a Tesla é a única que mantém mais clientes do que perde”, destaca.

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Apesar dos bons resultados no IQS 2023, a Dodge manteve seu índice de fidelização dos clientes inalterado, em relação ao ano passado, enquanto a RAM amargou a perda de 12,2 pontos percentuais – ou seja, perdeu 12 clientes de cada 100 que possuía.

Já a fidelidade à virada da eletromobilidade chegou a 67,8% só em abril, comprovando que praticamente sete de cada dez pessoas que trocam um modelo convencional por outro, 100% elétrico, jamais retornam aos motores a combustão interna.

Este texto contém análises e opiniões pessoais do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Mobiauto.

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