O automobilismo está mesmo ameaçado de sucumbir no Brasil?

O automobilismo é uma paixão cara e inacessível e cara para a maioria dos brasileiros, mas poderia ser mais lucrativo se fosse bem explorado
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29.09.2022 às 12:18
O automobilismo é uma paixão cara e inacessível e cara para a maioria dos brasileiros, mas poderia ser mais lucrativo se fosse bem explorado

No meio entusiasta existe uma máxima que diz: a primeira corrida de automóvel aconteceu cinco minutos depois do segundo automóvel ficar pronto. Não sabemos se isso realmente ocorreu, mas conhecendo o espírito competitivo da raça humana, não é de se esperar nada muito diferente.

No Brasil, quando falamos de grandes eventos internacionais nos remetemos aos anos de 1930, com as primeiras provas no Circuito da Gávea. Este, localizado no Rio de Janeiro e conhecido como “Trampolim do Diabo”, tinha 11 km de comprimento e abrigava famosos pilotos de todo o mundo.

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Correndo em vias urbanas cheias de asfalto, cimento, trilhos de bonde, meio fio, espectadores… Subindo a serra e voando pela estreita pista entre a montanha e o mar. Uma espécie de Mônaco para maiores. Deste início nasceu o cenário automobilístico brasileiro. 


O surgimento dos primeiros autódromos no Brasil

O automobilismo é uma paixão cara e inacessível e cara para a maioria dos brasileiros, mas poderia ser mais lucrativo se fosse bem explorado

Nas décadas seguintes, foram impulsionadas as construções de muitos autódromos pelo Brasil. Em 1940, por exemplo, era inaugurado Interlagos, com a pista original, bem maior do que a de hoje, mas ainda no mesmo espaço. Mais tarde, em 1972, foi palco do primeiro Grande Prêmio do Brasil de F1, corrida essa que marcou a inclusão do país no calendário oficial. 

Com o passar dos anos cada Estado foi tentando, na medida do possível, construir seus espaços de corrida. Curitiba inaugurou em 1967, Brasília inaugurou seu espaço em 1974, Rio de Janeiro inaugurou Jacarepaguá em 1977, além de diversos outros pelo país.

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Todas essas cidades tiveram eventos lotados, autódromos com agendas cheias, entusiastas, pilotos que fizeram sucesso no Brasil e no mundo, eventos regionais, eventos amadores…. Mas de uns anos para cá vimos alguns gigantes desaparecendo. Onde a coisa desandou? Bom, para explicar isso, é necessário desenharmos uma linha do tempo.


Os custos por trás de um autódromo 

O automobilismo é uma paixão cara e inacessível e cara para a maioria dos brasileiros, mas poderia ser mais lucrativo se fosse bem explorado

Um autódromo é, basicamente, uma área ENORME, que tem maior utilização nos fins de semana. Na maior parte do tempo, é uma estrutura ociosa. Caso não seja bem administrado e bem explorado comercialmente de segunda a quinta, ele vira um elefante branco. 

Pense nos gastos com segurança e conservação do espaço (energia, água, paisagismo, limpeza, manutenção etc.). Agora imagine que na época que a maioria deles foram construídos, nada existia ao seu redor. Como diz o povo: era tudo mato!

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Mas, com o passar dos anos, a região que abriga o autódromo virou uma área nobre, onde a especulação imobiliária é enorme, os vizinhos reclamam do barulho produzido e o metro quadrado possui alto valor. O que compensa mais: manter esse espaço ocioso, pelo menos sob a ótica econômica, ou lotear, gerando vários IPTUs?

Sim, essa é a visão de quem só olha o lado econômico do espaço. E não: a minha posição é outra. Eu consigo ver o todo e explico: o automobilismo não movimenta só o lucro de bilheteria do fim de semana. É muito mais do que isso! 


Como o automobilismo poderia ser mais acessível e ao mesmo tempo lucrativo?

Existe toda uma rede de pessoas que trabalham em oficinas de preparação, existem as autopeças que vendem os insumos para que essas pessoas montem e preparem veículos para competições. Fora o mercado de pneus, combustíveis, lubrificantes, serviços médicos e de resgate, rede hoteleira para hospedar os visitantes, rede de transporte, locadoras de carros, restaurantes…

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Sim, eu sei que o automobilismo é um esporte caro e acessível para poucos, mas, se bem explorado, ele pode render lucro, como qualquer outro esporte. Os benefícios indiretos estão aí e nunca são lembrados.

Existem pessoas que defendem que deveríamos ter mais autódromos atendendo as exigências máximas da FIA (Federação Internacional do Automobilismo), assim sendo capazes de sediar eventos das categorias máximas do automobilismo mundial. Eu me pergunto: para quê? Já temos um autódromo excelente para receber esses eventos, e vez ou outra sua viabilidade é questionada. 

Não temos mercado para absorver, nem interesses econômicos para viabilizar, mais GPs de Fórmula 1 ou etapas da Fórmula Indy por aqui. Deveríamos focar em ter bons autódromos, com segurança e infraestrutura necessária para receber etapas nacionais e regionais, além de eventos amadores regulamentados pela CBA (Confederação Brasileira de Automobilismo).

Nós queremos ter a possibilidade de assistir regionais nas nossas cidades, de ver a Stock Car, ou andar num track day a um custo acessível. Como isso é possível? Simplificando os autódromos existentes com uma boa gestão, sem buscar certificações internacionais em todos eles, somente mantendo-os usáveis e viáveis financeiramente. 

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Precisará ter shows e festivais de música? Sim! Vai ter compartilhamento de espaço com outras atividades? Vai! Ao menos vai manter o espaço vivo e defendido de forças externas, como a especulação imobiliária.

Já perdemos o Autódromo Internacional Nelson Piquet (Jacarepaguá) e o Autódromo Internacional de Curitiba desse jeito. O Autódromo Internacional Nelson Piquet (Brasília) está fechado há cerca de sete anos para obras que iriam o transformar num autódromo de ponta… 

Quantos mais vamos perder até que a comunidade de praticantes, entidades regulamentadoras, fornecedores e espectadores do automobilismo entendam que precisam se unir e lutar por mais espaços viáveis?

William Marinho, engenheiro mecânico e entusiasta do mundo automotivo.

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