JAC E-JS1: destrinchamos o estado de um elétrico usado com 120.000 km

Avaliamos desempenho, autonomia, estado mecânico e preço de revenda de um elétrico que foi usado sem cerimônias nos primeiros anos de vida
LF
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21.11.2023 às 09:00
Avaliamos desempenho, autonomia, estado mecânico e preço de revenda de um elétrico que foi usado sem cerimônias nos primeiros anos de vida

Uma das grandes dúvidas a respeito do futuro da eletromobilidade é como serão os carros elétricos no mercado de usados. E não estamos falando apenas de seu nível de depreciação em relação a modelos convencionais ou híbridos, mas sim de seu estado mecânico: eles aguentam o tranco para serem usados continuamente ao longo de anos e mais anos?

Para avaliar esta questão, a Mobiauto rodou por uma semana com um JAC E-JS1 ano-modelo 2022, comprado no final de 2021 para uso em uma frota de empresas. Na época, o primeiro proprietário pagou R$ 145.000 no veículo da versão Extreme a mais cara da gama.

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Após um ano e meio de uso e 117.000 km rodados, ele foi recomprado pelo próprio Grupo SHC, representante da marca JAC no Brasil, por R$ 100.000, na troca por um veículo mais novo da mesma marca. Nossa reportagem pegou o veículo com exatos 118.832 km no odômetro e alguns desafios pela frente.

Ao longo da semana cheia em que ficamos com o carro, testamos não apenas o desempenho do veículo, como também seu estado mecânico, estado e comportamento das baterias, capacidade de recarga e valoração real no mercado de usados, levando-se em conta a alta quilometragem.


Para avaliarmos as condições mecânicas do modelo, levamos o E-JS1 usado à Dotta Automotive, consultoria que está formando um braço especializado na manutenção de veículos híbridos e elétricos, e a quem agradecemos gentilmente o atendimento para esta reportagem. O resultado pode ser conferido no vídeo abaixo:


Sobre o JAC E-JS1

O JAC E-JS1 é um modelo subcompacto que, na linha 2023, como 0 km, é oferecido em duas versões. A básica custa R$ 126.900 e a de topo, Extreme ou EXT, R$ 150.900. Traz um motor elétrico dianteiro com 62 cv de potência e 15,3 kgfm de torque, e um banco de baterias que permite uma autonomia de 302 km (ciclo NEDC), segundo a JAC, ou de 161 km no Inmetro.


Em termos de dimensões, o JAC E-JS1 tem 3.650 mm de comprimento, 1.670 mm de largura, 1.540 mm de altura e 2.390 mm de entre-eixos, sendo apenas 121 litros de porta-malas. Confira toda a ficha técnica e lista completa de itens de série do veículo avaliado por nossa reportagem mais abaixo.


Seu pacote de equipamentos é enxuto, mas já conta com itens como chave com sensor presencial, partida do motor por botão, controles de estabilidade e tração, freio de estacionamento eletrônico, assistente de rampa (que às vezes não funciona), câmera de ré, sensores traseiros de estacionamento, quadro de instrumentos digital e central multimídia.


Não há projeção de celulares via Android Auto ou Apple CarPlay, apenas espelhamento através de um sistema nativo chamado EasyLink, que demanda conexão do smartphone ao veículo via cabo USB tipo A e Bluetooth. Ele dá acesso integral a todas as funções do aparelho, incluindo aplicativos como YouTube ou WhatsApp. Ou seja, use com cuidado e segurança!


Por ser um subcompacto de entrada, o JAC E-JS1 tem suas limitações, como o porta-malas apertado de apenas 121 litros e o porta-luvas aberto. Mas proporciona um espaço interessante para pernas na fileira traseira e se tornou um carro visado por motoristas de aplicativo que querem economizar com o consumo de combustível.


Desempenho e dirigibilidade do JAC E-JS1 com 120.000 km

Em nosso teste, rodamos 273 quilômetros com o E-JS1 2021/22. Boa parte foi em ambiente urbano, mas chegamos a compor quase 30% de nosso ciclo com ele em rodovias. O desempenho foi aquilo que esperávamos: o motor entrega torque equivalente a modelos 1.6 aspirados, o que permite arrancadas e retomadas muito espertas, mas falta elasticidade.


Não percebemos qualquer tipo de anomalia ou comportamento não linear do motor elétrico, que aparentou estar em bom estado. Sua velocidade máxima é limitada a 110 km/h, o que denota a proposta quase puramente urbana deste subcompacto.

O comportamento das suspensões surpreendeu positivamente. Seus ângulos de transposição e vão livre são limitados – tanto que seu assoalho demonstrava várias marcas de impacto –, mas a carroceria não aparentava estar “dançando” ao transpor obstáculos.


Seu comportamento não apresentou nada que um carro popular a combustão com quilometragem similar também não tivesse proporcionado: alguns rangidos e sensação muito leve de folga, mas um nível satisfatório de estabilidade e conforto. Só os pneus da marca Fuzion mostraram um nível de aderência mais baixo do que o esperado em situação de chuva.


Baterias e recarga

Ao mesmo tempo, as baterias do JAC E-JS1 usado demonstraram um comportamento linear durante todo o uso. O nível de carga jamais caiu abruptamente e a autonomia real de uso, sempre com ar-condicionado ligado, esteve sempre orbitando uma faixa entre 180 km e 200 km.


Nada próximo aos 300 km declarados oficialmente, mas acima do número homologado pelo Inmetro. Recarreguei as baterias após 157 km rodados, com 23% ainda restantes, o que me daria exatos 193,11 km de alcance naquele ciclo.


O banco de LFP (lítio-ferro-fosfato) tem 30,2 kWh de capacidade e permite uma recarga rápida em até 50 kW para recuperar entre 15% e 85% da carga em 1 hora. Como eu estava sem pressa, deixei até os 100% e o processo levou exatas 3 horas e 29 minutos.

Fiz a recarga em um posto da InCharge no Santana Parque Shopping, Em São Paulo (SP). Não paguei por ela, bancando apenas os R$ 17 da diária de estacionamento.


Detalhe: o bocal de carregamento do JAC E-JS1 é o GP/T, comum na China, e não do Tipo 2, o padrão mais comum entre carregadores rápidos usados no Brasil. Ou seja, precisei de um adaptador, fornecido pela própria JAC, mas deu certo. Porém, há relatos de carregadores rápidos que bloqueiam o processo por conta do uso desse adaptador. É bom ficar atento.


Estado mecânico

Feito todo o rolê, chegou a hora de levar o E-JS1 com quase 120.000 km para ter sua mecânica avaliada na Dotta Automotive. Lá, o consultor Nelson Fernando fez o scanner do veículo através da entrada OBD2 e, depois, ergueu o carro na plataforma.

O que ele encontrou: um assoalho muito marcado pelo uso severo, com chapas de carroceria, parafusos externos e manta protetora ostentando vários ralados e algumas deformações provenientes de impactos contra o solo.


Porém, as baterias estavam muito bem protegidas, pois ficam acasuladas em uma chapa grossa de alumínio, que ainda recebe a já mencionada manta protetora. No scanner, Nelson detectou um pequeno “surto de recarga”, consequência do uso constante do adaptador para recarga rápida. No longo prazo, essa característica pode afetar a vida útil dos módulos da bateria.


Contudo, os módulos se encontravam com boa capacidade de armazenamento de energia e bem balanceados – caso um único módulo esteja desbalanceado, compromete a capacidade de armazenamento de todos os outros.

As suspensões se encontravam íntegras, tanto o eixo dianteiro (McPherson) quanto o eixo de torção traseiro, assim como os quatro amortecedores e as molas traseiras. A única observação foi para uma pequena folga na barra estabilizadora dianteira. Segundo o consultor, “normal” para qualquer veículo com 120.000 km rodados.


O ponto de maior atenção ficou para um pequeno vazamento de fluido detectado no sistema de transmissão. “Provavelmente está ligado ao uso severo do veículo”, constatou Nelson. Segundo ele, um carro a combustão com essa quilometragem e submetido a uma rodagem igualmente intensiva, a trabalho, também estaria sujeito a um vazamento do tipo.


Ou seja, nosso JAC E-JS1 com dois anos de uso não apresentou nenhum problema ou falha que qualquer outro automóvel com seu histórico de quilometragem ou uso também não pudesse acusar.


Destaque positivo para o estado de acabamento do veículo: as peças de plástico rígido ainda se encontravam bem montadas e com bom aspecto, com exceção ao depositório de celular no console central, este já mais desgastado e até arranhado.


Havia outros arranhões nas costas do console central e ralados nas rodas de liga leve. Por outro lado, o couro sintético dos bancos estava quase impecável.


Valor de revenda

O maior ponto de atenção de um elétrico usado como o JAC E-JS1 2021/22 que testamos é sua desvalorização na revenda. Seu preço na Tabela Fipe se aproxima de R$ 120.000 e o Grupo SHC recomprou a unidade que testamos por R$ 100.000, em uma estratégia de subsidiar esta aquisição para facilitar a revenda de outro elétrico 0 km.


Contudo, em nossas consultas com lojas multimarcas independentes, recebemos cotações entre R$ 60.000 a R$ 70.000, devido à alta quilometragem do veículo em questão. Apenas uma unidade com menos de 30.000 km seria avaliada em mais de R$ 90.000, ainda bem abaixo da Fipe, segundo nossas consultas.

Estudo recente feito pelo time de Inteligência de Dados da Mobiauto mostra que um carro elétrico ainda apresenta um índice muito mais alto de desvalorização do que qualquer outro no mercado: 16,28% após o primeiro ano de uso, contra 8,78% de um híbrido e 7,87% de um a combustão.


JAC E-JS1 EXT 2022 – Ficha técnica

Preço: R$ 116.642 (Fipe)

Motor: elétrico, transversal, dianteiro, assíncrono
Potência: 
62 cv
Torque: 
15,3 kgfm
Peso/potência: 19,03 kg/cv
Peso/torque: 77,12 kg/kgfm
Câmbio: automático, 1 marcha
Tração: dianteira
0 a 100 km/h: 
10,7 s
Velocidade máxima: 
110 km/h (limitados eletronicamente)

Bateria: LFP (lítio-ferro-fosfato)
Capacidade: 30,2 kWh
Consumo elétrico: 10,4 kWh/km
Autonomia (Inmetro): 161 km
Capacidade de recarga: 50 kW
Carregador: Tipo GP/T
Recarga rápida (DC): 15% a 85% em 1 hora
Recarga lenta (AC): 18% a 96% em 6 horas

Dimensões e capacidades: 3.650 mm de comprimento, 2.390 mm de entre-eixos, 1.670 mm de largura, 1.540 mm de altura, 121 litros de porta-malas, 450 kg de carga útil, 1.180 kg de peso em ordem de marcha.

Dados técnicos: direção elétrica; suspensão McPherson (dianteira) e eixo de torção (traseira); freios a discos ventilados (dianteira) e discos sólidos (traseira); diâmetro de giro, 9 m; coeficiente aerodinâmico não divulgado; vão livre do solo, 13 cm; ângulos de ataque, saída e transposição de rampas não divulgados; pneus, 165/65 R14; estepe por kit de reparo emergencial

JAC E-JS1 EXT 2022 – Itens de série

  • Pintura bicolor
  • Chave com sensor presencial
  • Partida do motor por botão
  • Controles de estabilidade e tração
  • Freio de estacionamento eletrônico
  • Volante multifuncional
  • Assistente de partida em rampas
  • Ar-condicionado automático digital
  • Regeneração de energia cinética nas frenagens em três níveis
  • Duas tomadas USB tipo A
  • Tomada 12 V
  • Sensores traseiros de estacionamento
  • Câmera de ré
  • Bancos revestidos em couro sintético
  • Quadro de instrumentos digital
  • Central multimídia com tela de 10,25 polegadas com espelhamento de celulares (CarBitLink)
  • Ganchos Isofix para cadeirinhas infantis
  • Controle de cruzeiro
  • Faróis com DRL de LED, projetores e regulagem manual de altura do facho
  • Pneus de uso misto
  • Rodas de liga leve aro 14 diamantadas com acabamento bicolor

Vale a pena comprar um carro elétrico usado?


O mercado de veículos eletrificados ainda é muito novo e incipiente. Muitas questões seguem sem respostas e alguns problemas são apenas potências prestes e acontecer de fato. Entretanto, nosso teste com o JAC E-JS1 com dois anos de uso e quase 120.000 km ajudou a desmistificar alguns preconceitos e espantar alguns fantasmas.

Por exemplo: todo carro elétrico está sujeito a dar problema, claro. Assim como qualquer carro a combustão. Mas eles já estão mostrando que também são capazes de aguentar o tranco do uso diário, mesmo que severo, como foi o caso do veículo que avaliamos. E como possuem milhares de componentes a menos, sua manutenção costuma ser até mais simples!

No fim das contas, o que mais pode pesar contra essa compra é a falta de infraestrutura de recarga – este é um ponto no qual o dono de um elétrico precisa aprender a se planejar – e o nível ainda acentuado de depreciação. Para quem souber lidar com essas questões, a experiência de uso pode ser a mesma de um carro a combustão, só que mais ecológica.

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