Chevrolet Chevette Junior: o carro 1.0 mais manco que o Brasil já viu

Com projeto antigo e que desperdiçava boa parte da potência ao usar tração traseira, ele foi uma resposta provisória e improvisada ao Fiat Uno Mille
LA
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13.09.2023 às 17:30
Com projeto antigo e que desperdiçava boa parte da potência ao usar tração traseira, ele foi uma resposta provisória e improvisada ao Fiat Uno Mille

Chevrolet Chevette Junior. A versão mais rejeitada e incompreendida do sedan compacto, e também o carro com motor 1.0 mais lento a rodar pelas ruas brasileiras. É ele o homenageado da coluna desta semana.

Em 1973, a GM lançava no Brasil a quarta geração do Opel Kadett, nosso querido e saudoso Chevrolet Chevette. Em época de regime militar, o compacto então com um conceito moderno adotava o nome Chevette, usado no exterior para versões do Kadett, a fim de evitar qualquer associação à patente militar.

Usando um moderno motor 1.4 de 68 cv de potência SAE (56 cv ABNT) a 5.800 rpm e 9,8 kgfm de torque a 3.800 rpm, o Chevette  ia de 0 a 100 km/h em 19,1 segundos, e tinha velocidade máxima de 140,2 km/h. Os números podem parecer ruins hoje, mas eram muito bons para o início dos anos 1970.

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Logo, o Chevette fez muito sucesso pelo conforto, estilo e robustez, que foi comprovada com o passar dos anos. Com sua tração traseira, angariou fãs pela facilidade de uso em pisos difíceis, sendo um concorrente direto dos VW refrigerados a ar, imbatíveis neste tipo de terreno, ou mesmo para manobras mais audaciosas e exibicionistas de alguns garotos aventureiros.

Seu primeiro facelift foi apenas na dianteira, em 1978, trazendo linhas mais fluidas e em compasso com os modelos mundo a fora. Em 1979, veio a reformulação de sua traseira, com o lançamento da linha 1980 (coisas dos anos 70 e 80), ano em que a GM lançava a variante hatch do modelo.

O design do Chevette Hatch agradou bastante, mesmo com sua ineficiente ergonomia, porta-malas pequeno e alto consumo. Nos idos de 1980, foi apresentada a linha 1981 e mais um integrante: a perua Marajó.

Lançada em 82, a linha 1983 trazia uma grande reformulação, dando linhas mais modernas e equiparadas ao moderno Monza. Nesta época, o Chevette tinha, além do motor 1.4, o motor 1.6 com 78 cv SAE (66 cv ABNT) de potência e 12,4 kgfm de torque, e ia de 0 a 100 km/h em 17,64 segundos, com velocidade máxima de 149,377 km/h.

Ainda em 1983, a GM apresentou a picape Chevy 500, com capacidade de carga de 500 kg e tração traseira. Fez muito sucesso devido à capacidade de encarar terrenos difíceis, e ainda é vista rodando (sempre a trabalho) pelo interior do País. A partir de 1984, o motor 1.4 saía de cena, permanecendo apenas a versão 1.6.

A partir da linha 1986, o Chevette passou a ser oferecido em todas as versões com o câmbio automático de três marchas, sendo uma excelente opção para os raros fãs deste tipo de transmissão àquela época.

Em 1987 veio seu último facelift, recebendo novos padrões de acabamento e para-choques envolventes de plástico, saia dianteira, lanternas traseiras redesenhadas, retrovisores externos envolventes e maiores, maçanetas pretas e novo quadro de instrumentos com mostradores quadrados e relógio digital, este exclusivo das versões SE, depois SL/E e por vez a versão DL.

O Chevette ficava ainda mais parecido com o já consagrado irmão maior, o Monza. No mesmo ano, a configuração hatch era descontinuada. Em 1988, a GM lançou o motor 1.6/S com melhorias substanciais. A versão a gasolina tinha 73 cv ABNT e 12,6 kgfm, com um 0 a 100 km/h em 14,1 segundos e velocidade máxima de 151 km/h.

Apesar da idade avançada do projeto, o motor ainda tinha fôlego para concorrer com Ford Escort 1.6 e Fiat Uno 1.3, mas era fraco ante o “mito” AP-1600 dos modelos da Volkswagen, que apresentava maior potência, melhor desempenho e ainda era mais resistente.

A explosão dos carros 1.0

Eis, que em 1990, uma redução de 40% para 20% na alíquota do IPI vigente viabilizou o lançamento do primeiro carro popular dos novos tempos, o Fiat Uno Mille. Ele foi o grande responsável pela explosão de carros 1.0 nas ruas ao longo das décadas de 1990 e 2000.

Seu motor era o antigo 1050 do Uno S a gasolina e Fiat 147, mas com a capacidade cúbica reduzida a 994 cm³. Oferecia 48,8 cv de potência e 7,4 kgfm de torque, indo de 0 a 100km/h em 20,04 s e chegando a 133,1 km/h de velocidade máxima. O consumo era bom, considerando a alimentação por carburador de corpo simples: 10,8 km/l com gasolina na cidade e 13 km/l na estrada.

A chegada do Chevette Junior

Todas as marcas começaram a apresentar seus concorrentes, e a GM foi a segunda a lançar um modelo com motor 1.0: o famigerado Chevette Junior. Espartano e dotado de um projeto muito antigo em concepção e estilo, ele usava de todos os artifícios para ser atrativo e barato.

A GM usou o finado motor 1.4 como base para projetar seu primeiro motor 1000 e, como resultado, os componentes ficaram superdimensionados, ou seja, muito pesados e maiores, mas prometiam ao menos um desgaste menor.

Ao mesmo tempo, fez de tudo para deixar o Chevette Junior mais leve: eliminou os encostos de cabeça dos bancos, o retrovisor externo direito, junção do para-choque e frisos laterais. Os carpetes, plásticos do painel e os vidros eram mais finos, além de ter pouco revestimento acústico em sua cabine. Mesmo assim, o Chevette Junior era pesado: 863 kg ante 795 kg do Fiat Uno Mille.

Como itens de série, trazia bancos de veludo (o mesmo do Kadett SL), termômetro no painel, retrovisor interno dia/noite, ventilador com controle eletromagnético, pneus 155SR13 e ignição eletrônica.

Como opcionais, oferecia bancos com reclinador e encostos de cabeça dianteiros, retrovisor do lado direito, temporizador do limpador do para-brisas, lavador elétrico do para-brisas, desembaçador traseiro, regulagem interna dos retrovisores externos, acendedor de cigarros, pintura metálica e câmbio de cinco marchas.

Com o diferencial encurtado em 25% e relação das três primeiras marchas reduzida, a quarta marcha não foi alterada. A quinta, opcional, era do tipo Overdrive, com apenas 600 rpm de diferença se comparada à quarta.

Essa diferença pequena tem uma explicação técnica: graças à pouca potência e pouco torque do motor, além das perdas de potência pelo uso de tração traseira, ao se engatar a quinta, o motor tem mais dificuldades em manter a velocidade constante, sendo assim, a quinta era mais indicada para uso em retas ou decidas, possibilitando poupar um pouco mais de combustível.

Com 50 cv de potência ABNT (a 6.000 rpm) e 7,2 kgfm de torque (a 3.500rpm), o motor fazia força (e barulho). E como ainda havia a perda de potência graças à tração traseira (parte da força se desperdiçava no “caminho” pelo cardã até o diferencial), na prática chegavam às rodas aproximadamente 28 cv.

Com isso, o Chevette Junior ia de 0 a 100 km/h em longos 21,58 s e atingia apenas 131 km/h de velocidade máxima, em quarta marcha. Alimentado por carburador de corpo simples, não era econômico: fazia 9,26 km/l de gasolina na cidade e 13,77 km/l na estrada.

Custando Cr$ 18.000.000,00 em março de 1992, ou R$ 89.945,28 atualizados pelo INPC IBGE, era o carro mais barato do Brasil. Nada disso agradou ao público e, em 1993, graças a uma nova resolução do governo reduzindo a alíquota de veículos com motor 1.6 boxer e/ou de tração traseira (parece até que alguém foi privilegiado com isso né), os veículos com esses motores passaram a ter a chancela de popular.

Com isso, a GM tratou logo de substituir o Chevrolet Chevette Junior pelo Chevette L, com motor 1.6 e muito mais disposição. Mas, caro leitor, o mercado consumidor é também modista, e não entendia as vantagens de se ter um carro 1.6 com bom preço. A moda era o 1.0 (!), e GM sabia que o Chevette não era mais competitivo.

Desenvolvendo a sua versão do Opel Corsa desde que lançou o Chevette Junior, como em um jogo de xadrez, aguardou o momento certo para fazer sua jogada e no final de 1993 o Chevette dava adeus ao mercado para a chegada do Chevrolet Corsa, este sim, um verdadeiro representante do segmento que mais vendeu carros no Brasil nos anos 90 e 2000.

Este texto contém análises e opiniões pessoais do colunista e não reflete, necessariamente, a opinião da Mobiauto.

Leonardo França é formado em gestão de pessoas, tem pós-graduação em Comunicação Empresarial e Marketing Digital, e vive o jornalismo desde a adolescência. Atua há 18 anos com gestão e consultoria automotiva, auxiliando pessoas a comprar carros em ótimo estado e de maneira racional. É criador dos canais Autos Originais e Auto e Autos…

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