Carro flex 20 anos: ele moldou o Brasil e será pedra no sapato dos elétricos

“Jabuticaba” brasileira, o etanol levou ao carro flex, que por sua vez pode abrir um caminho alternativo só nosso em resposta aos veículos elétricos com bateria

LF
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23.03.2023 às 10:29 • Atualizado em 29.05.2024
“Jabuticaba” brasileira, o etanol levou ao carro flex, que por sua vez pode abrir um caminho alternativo só nosso em resposta aos veículos elétricos com bateria

O carro flex está completando 20 anos neste 23 de março de 2023. Mais do que as duas décadas de história e revolução no mercado nacional, goste-se dele ou não, ele também influenciará, e muito, os rumos que o Brasil tomará na era da eletromobilidade.

Quando a ditadura militar brasileira criou o Programa Nacional do Álcool, em 1975, mirava em uma alternativa para que o país não ficasse à mercê dos combustíveis fósseis. O alvo era a crise do petróleo, mas os criadores do projeto jamais imaginariam, na época, que aquela iniciativa poderia ditar rumos surpreendentes para o Brasil no século 21.

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Especialmente porque, naquela época, carros a álcool se tornaram motivo de descontentamento e chacota. Quem já precisou dar partida em um Chevette a álcool de manhã cedo em pleno inverno, estando atrasado para um compromisso e correndo o risco de “afogar” o carro caso errasse a mão no uso do afogador, entende bem o porquê.

Por esse motivo, modelos movidos a etanol sempre foram mais desvalorizados do que os a gasolina, embora o etanol sempre tenha sido mantido no radar como uma alternativa para fazer de nosso país um vanguardista no uso de combustíveis renováveis.

É nesse cenário que surgiu, em 2003, o VW Gol Total Flex. Com direito à presença do então presidente, Luís Inácio Lula da Silva, a Volkswagen aproveitou a festa de 50 anos de suas operações no Brasil para apresentar o primeiro carro flexível (ou seja, capaz de receber dois tipos diferentes de combustível no tanque, em qualquer quantidade) feito em nosso país.

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Vale lembrar que os Estados Unidos já trabalhavam com veículos bicombustíveis desde os anos 1980, com metanol ou etanol derivado do milho. Por lá, a iniciativa fracassou retumbantemente, mas por aqui o fato é que o carro flex pegou, especialmente por conta dos incentivos do governo na tributação.

Veículos movidos a etanol ou flexíveis pagam percentuais menores de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), porque considera-se que o etanol emite menos poluentes no meio ambiente. E com a vantagem de que as plantações de cana-de-açúcar absorvem o dióxido de carbono de volta na fotossíntese, gerando o que se costuma chamar de “crédito de carbono”.

Hoje, apesar de reclamações contra as taxas de compressão que não são ideais nem para a gasolina, nem para o etanol, ficando em um incômodo meio termo, os motores flex já apresentam comportamento muito similar independentemente do combustível usado.

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Soluções como o famigerado tanquinho de partida a frio e, depois, os bicos injetores ou as galerias que pré-aquecem o etanol frio antes da partida contribuíram para isso. Tanto que, já a partir de 2008, o Brasil passou a concentrar mais de 90% das vendas de seus veículos leves em modelos flex. De 2003 para cá, mais de 40 milhões de automóveis e comerciais leves do tipo foram comercializados.

Eu mesmo tenho um carro flex com sete anos de uso, só uso etanol para rodar na cidade (deixo a gasolina para situações pontuais ou ter uma autonomia maior na estrada), e nunca sofri nenhum tipo de problema. Ele passa por revisões regularmente e o motor segue suave como sempre...

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Fato é que, aos trancos e barrancos, o etanol se estabeleceu no Brasil e, por isso mesmo, fabricantes querem aproveitar para usá-lo como fonte alternativa aos carros elétricos no futuro de nosso mercado, dispensando o investimento em veículos movidos a bancos de bateria.

Os maiores defensores do combustível vegetal alegam – com boa dose de razão – que um veículo movido a etanol polui menos do que qualquer elétrico, cujo banco de baterias foi produzido a custos ambientais altíssimos e que, muitas vezes, será recarregado usando eletricidade de fontes como usinas de carvão ou geradores a diesel.

É óbvio que a análise não é tão simplista. Afinal, para se ter uma plantação de cana, uma área de floresta foi devastada. Entrementes, soluções como as células de combustível que convertem etanol a hidrogênio da Volkswagen ou o motor turbo a etanol da Stellantis podem, sim, ditar os rumos do automóvel do Brasil no futuro.

O etanol surgiu como uma jabuticaba bem brasileira. O carro flex, nascido dessa semente, virou outra. E pode render outra árvore florida de veículos que ocuparão o lugar de carros elétricos no Brasil nas próximas décadas.

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